Não sabia bem se era uma pessoa, naturalmente, complicada, ou se alguém que complicava as coisas sem necessidade.
Sabia que não gostava do incerto, de não saber com o que contar.
Não acreditava no destino e, talvez por isso, lhe custasse ainda mais acreditar que, algures no tempo, sem que estivesse à espera, coisas boas viessem a acontecer.
Era uma pessoa que gostava de tudo planeado, de saber tudo com antecipação.
Não era propriamente simpatizante de surpresas.
Por isso, aquele compasso de espera, sem saber bem o que esperar, era inquietante.
Sentia uma certa ansiedade.
Uma necessidade de antever o futuro.
A urgência de que tudo acontecesse rapidamente quando, o que mais precisava, sem o saber, era daquele tempo que, agora, lhe tinha sido dado.
Ou até sabia.
Sabia que tinha de passar por isso.
Que se tornaria uma outra pessoa.
Que aprenderia com esta nova experiência.
Mas queria fazê-lo sabendo que, lá à frente, haveria algo guardado para si.
Como se a vida desse garantias de alguma coisa a alguém.
Que atrevimento esperar que, consigo, fosse diferente!
Quanta petulância, achar que era uma peça diferente das outras, naquele jogo.
Enquanto isso, ia levando dia após dia, alimentando-se de histórias fictícias que, ainda que nunca permitissem saborear, deixavam o odor no ar, apaziguando o desejo de, também um dia, voltar a provar.
Mas, para quê?
Se sabia perfeitamente que, mais cedo ou mais tarde, as coisas voltariam a deixar de ter o mesmo sabor da primeira vez?
Para quê querer viver, novamente, algo que sabe que não é para si?
Para quê cair, novamente, no mesmo erro? E arrastar alguém para esses mesmos erros?
E, no entanto, continuava a querer!
Enquanto uma voz lhe dizia que não se metesse nisso, uma outra implorava para que ignorasse a primeira.
Até quando viveria nesta dualidade?
Porque é que, para algumas pessoas, parece ser tão fácil? Tão básico? Tão certo?
Mas não, totalmente, para si?
Porque é que, tantas vezes, era uma pessoa que sentia vontade de se enrolar sobre si própria, e assim ficar, como um animal que hiberna, para se poupar, conservando e armazenando energia no inverno, para depois sair da toca na primavera e, outras tantas, parecia não querer nada disso?
Ainda assim, sentia-se uma pessoa grata.
Grata por lhe ser permitido viver, quando via tanta gente, à sua volta, perder essa luta, das mais variadas formas.
Grata por ainda poder experienciar essa confusão de sentimentos, tão típica do ser humano quando, a tantas outras pessoas, lhes foi vetada.
Grata por poder ter uma palavra a dizer, no rumo da sua vida, ainda que não faça a mínima ideia de para onde se dirigir.
Porque, apesar da incerteza, havia uma certeza que ninguém lhe poderia tirar: ainda tinha uma vida a ser vivida!