... não é fácil.
Está a fazer três anos que o meu pai foi diagnosticado com insuficiência cardíaca, e insuficiência renal.
Desde então, já algumas vezes se foi abaixo, já algumas vezes tememos o pior, e outras tantas, deu a volta e mostrou vontade de por cá continuar.
Desde então, foram algumas as viagens, consultas e um segundo internamento a deixarem-no debilitado, mas de volta a casa, para recuperar.
Desistiu das consultas, rejeitou as eventuais cirurgias, e rejeitará, provavelmente, quando chegar a hora, a hemodiálise.
Nestes três anos, com os problemas de saúde a pregarem umas partidas, ficou mais dependente.
A cabeça também não está nos melhores dias. Embora ele tenha plena consciência da sua situação e dificuldades.
É difícil ter uma conversa normal com ele, faz muitas confusões, esquece-se do nome das coisas, temos quase que decifrar o que ele quer dizer.
Para falar com alguém ao telefone, tem que ter alguém para lhe "traduzir" o que, do outro lado, está a ser dito.
Ultimamente, queixa-se dos pulmões.
Nota-se a respiração acelerada.
O cansaço.
Uns dias dorme. Outros, nem por isso.
Mas não quer ir ao hospital. Não o censuro. Nem obrigo.
Ele conhece os seus limites e, sempre que se viu aflito, pediu para ir.
Mas a verdade é que, queiramos ou não, está o relógio a andar, em contagem decrescente.
Ontem, lembrou-se que tinha que cortar o cabelo.
Pediu ao meu tio para marcar hora no barbeiro.
Num dia de temporal.
Foi apanhar o autocarro da vila, duas horas antes. Não sei, sequer, se passou.
Não sei se não cai, se não escorrega por causa da chuva, se não se engana no barbeiro.
E ainda vai ter que esperar, na rua, que este abra.
Sei que vai apanhar frio.
Provavelmente, chuva.
Não sei como vai para casa.
Pedi para, caso estivesse a chover, chamar um táxi.
Teimoso como é, ainda é capaz de ir a pé.
E, depois, é mais cansaço, e mais uma noite com dores, pelo esforço.
Eu sei que ele quer manter e dar uso à pouca autonomia que ainda tem.
Mas, por vezes, isso depois, se correr mal, traduz-se em mais dependência.
Não posso ligar para ele, porque ele nem saberá atender o telemóvel (já confunde as teclas) e, mesmo que o atenda, não me ouvirá, pelo que não serve de nada.
Enquanto isso estou eu, aqui, com o "coração nas mãos".