Passageiros...
Desde pequena que me habituei a andar de autocarro e, por incrível que pareça, é uma das coisas que gosto de fazer.
Não naqueles autocarros a abarrotar de pessoas, que mais parecem sardinhas em lata, e que quase não nos deixam espaço para respirar. Isso seria um autêntico pesadelo!
Refiro-me aos autocarros que me costumam levar até à praia, ou até Lisboa. São viagens que se fazem normalmente, de forma tranquila. Sentados no nosso lugar, podemos ir apreciando a paisagem pela janela, aproveitar para dormir, conversar ao telemóvel ou ir, simplesmente, observando os passageiros que vão entrando e saindo.
Durante cerca de um ano, quase todos os fins de semana eu apanhava o autocarro para Lisboa, e em todos esses dias havia passageiros que, tal como eu, tinham essa rotina!
Entre eles, recordo-me de um casal que entrava na Malveira. Primeiro, entrava ele, e sentava-se. Ela entrava depois, pagava os bilhetes, e sentava-se ao seu lado, e pelo que me parecia, encostava a cabeça ao seu ombro, e assim permanecia durante toda a viagem. Eram duas pessoas fisicamente muito diferentes: ele - alto e magro, sempre com uma cara séria e pouco dado a manifestações de carinho, ela - baixa e um pouco mais avantajada, sempre transparecendo a imagem de uma mulher muito carinhosa e com muito amor para dar. Embora as aparências enganem, ela parecia-me mais velha que ele. E fiquei sempre com a sensação que aquele era um casal que não combinava muito bem.
Mas era apenas uma opinião de observadora. Afinal, há tantos casais improváveis que combinam na perfeição, e outros que parecem feitos um para o outro e acabam por não vingar.
Tal como eu e o meu namorado, também eles apanhavam o metro. E ao final da tarde, de volta ao terminal do Campo Grande, lá estavam eles, tal como eu, a apanhar o autocarro de regresso.
Um ano se passou até que, no último sábado, voltei a apanhar o autocarro para casa, e verifico que também esse casal, ao fim de tanto tempo, ainda mantinha esse hábito. Na verdade, só reparei nisso quando já estava sentada no meu lugar e olhei para os assentos da frente e, de facto, só o vi a ele. Mas, como ela é pequena, imaginei que estivesse, como era costume, aninhada no seu companheiro. E pensei: mesmo passado tanto tempo, ainda há coisas que se mantêm!
Qual não é a minha surpresa quando o vejo sair do autocarro sozinho. Não pude evitar o pensamento seguinte: onde estaria a sua companheira de viagem?
Parece que, afinal, nem tudo se mantém com o passar dos anos...