À Conversa com Luís Corredoura
Nascido em 1975, natural de Pêro Pinheiro, Luís Corredoura é Arquitecto e Mestre em Recuperação de Património.
No entanto, além dos projectos de arquitectura em que trabalha, também se dedica, desde muito cedo, à escrita.
A sua estreia deu-se em 2013, com o romance histórico “Nome de Código – Portograal”, obra cujo enredo decorre no período da Segunda Guerra Mundial e que tem como mote, entre outras coisas, um dossier sobre o passado de Hitler, que Salazar tem em sua posse, e que o ditador nazi tudo faz para recuperar.
Este romance histórico valeu a Luís Corredoura, no passado mês de Abril, o prémio “Encouragement Award”, atribuído pela European Science Fiction Society, reunida em S. Petersburgo, na Rússia, organização internacional de profissionais e fãs de ficção científica, cuja primeira convenção aconteceu em 1972, em Itália, e que tem por objectivo promover a ficção científica na Europa e a ficção científica europeia no mundo. A obra em questão foi também reconhecida pela organização do 9º Fórum Fantástico do Lisboa, em Novembro de 2014, tendo recebido o “Grande Prémio Adamastor de Literatura Fantástica”.
Em 2014, é a vez de “Lusitano Fado”, o seu segundo romance, ver a luz do dia. Trata-se de uma obra que fala de coragem e determinação, de mistério e revelação, de vingança e corrupção, mas também de paixão, companheirismo e amizade.
O “Lusitano Fado” teve a sua apresentação oficial a 30 de Setembro na FNAC do C.C. Alegro Alfragide. Em Mafra, a apresentação ocorreu no final de Novembro, no Café Basílica.
Este livro teve o privilégio de ser incluído na renovada colectânea “Livros RTP”, colecção que conta com o devido patrocínio e reconhecimento da estação televisiva estatal.
Luís Corredoura aceitou o convite do Marta – O meu canto, sendo o convidado de hoje da rubrica “À Conversa com…”:
Marta: Começo por perguntar, quem é o Luís?
Luís Corredoura: O Luís é um rapaz normalíssimo, nascido e criado em Pêro Pinheiro, entre o lioz com que é feito, entre outras coisas, o Convento de Mafra, o Aqueduto das Águas Livres, o Teatro D. Maria II, etc., etc., e que sempre teve uma obsessão quase patológica por História para tentar perceber os motivos que levaram a Humanidade, em geral, e Portugal, em particular, a seguir determinados rumos e a tomar certas decisões que marcaram indelevelmente o futuro das gerações que sucederam àquelas que viveram esses eventos na primeira pessoa.
Marta: Como surgiu a escrita na sua vida?
Luís Corredoura: Como diz um anúncio de uma conhecida marca de água, é algo “tão natural como a sua sede”. Quiçá por ter tido o privilégio de ter sido criado com livros – romances clássicos, dicionários, enciclopédias, etc. –, o certo é que sempre vivi com isso à minha volta. Daí à escrita, vai um pequeno passo, não obstante não haver tradição de “escritores” na família. De leitores, sim. E, p’lo que sei, desde o tempo dos meus bisavós.
Marta: Como arquitecto que é, e também escritor, o que lhe dá mais prazer – imaginar e desenhar todo um projecto arquitectónico ou escrever um romance?
Luís Corredoura: P’la experiência que tenho, posso dizer que é-me mais fácil fazer um projecto de “pedra e cal” do que um “projecto literário”. O primeiro, não obstante toda a complexidade que possa ter, envolve sempre uma multidisciplinaridade e um contínuo diálogo com os mais diversos intervenientes – dos donos da obra a técnicos das chamadas especialidades (térmico, acústico, estabilidade, etc.) -, o que obriga a manter um rigor e a não haver “dispersão”. O segundo é um processo mais moroso – e “doloroso” – porque, além de ser solitário, é algo deveras absorvente, o que se reflecte nas relações sociais e familiares. Costumo dizer que o melhor a fazer seria instalar uma ligação tipo USB na base da cabeça para poder ligar um cabo directamente a um computador e assim descarregar num ápice toda a informação acumulada, neste caso, o livro que se pretende escrever. Até lá, enquanto tal dispositivo não está disponível, tenho que me cingir às minhas limitações físicas e ir escrevendo/dactilografando conforme as minhas possibilidades.
Marta: E o que é mais difícil?
Luís Corredoura: Bom, creio que, sem querer, respondi a isto na pergunta anterior. Realço, somente, que até ao momento tem sido mais complicado escrever do que projectar. No entanto, são ambas actividades deveras exigentes, principalmente quando nelas “mergulhamos de cabeça”.
Marta: Em ambas as obras “Nome de Código – Portograal” e “Lusitano Fado” está presente a abordagem a factos históricos. Pode-se dizer que é um apaixonado por História?
Luís Corredoura: O conhecimento da História é fundamental, nomeadamente numa época – esta, aquela em que vivemos – em que há cada vez mais uma alienação do que foi o nosso passado, inclusivamente o mais recente, aquele que diz respeito aos últimos cinquenta ou quarenta anos. Os jovens portugueses, por exemplo – e refiro-me a pessoas com vinte e cinco/tinta anos -, desconhecem, na sua esmagadora maioria, o que foi o 25 de Novembro de 1975, o 11 de Março de 1975, o que ocorreu em Camarate, a 4 de Dezembro de 1980… E estou só a referir alguns dos factos mais importantes da História de Portugal das últimas quatro décadas. Quando recuamos um pouco mais, o descalabro é total. O paradigma, a bitola, passa p’los feriados civis. O que foi o 5 de Outubro? E o 1º de Dezembro? Este último, então, já nem sequer é feriado!...
Daí a importância da História. Num mundo cada vez mais globalizado, em que há um claro objectivo de “normalizar” as pessoas conforme os ditames das sociedades dominantes, i.é, anglo-saxónicas, nomeadamente a americana, as pessoas carecem cada vez mais de valores e de referências que as inspirem e que as distingam – no bom sentido, claro!... – da mediocridade que vai imperando, da ausência de valores e da superficialidade e futilidade que obnubilam as mentes dos que perdem tempo sentados diante de uma televisão ou nas chamadas “redes sociais”.
Marta: Qual tem sido o feedback recebido relativamente aos seus dois romances? Está previsto o lançamento de um novo livro para breve?
Luís Corredoura: Tem sido bom, nomeadamente quanto ao primeiro, algo que não deixa de ser curioso, visto o segundo ter tido muito mais divulgação pelo facto de estar englobado nos “Livros RTP”.
Jamais imaginei que pudesse vir a ganhar um prémio – quanto mais dois!... – por algo que escrevi. Independentemente de terem sido reconhecimentos por parte de entidades que não estão associadas ao chamado “mainstream” – e não, não houve direito, para lá de um diploma, a qualquer prémio pecuniário!... -, há que dar ênfase à componente moral, o que estimula qualquer autor a continuar, principalmente quando à nossa volta vemos que a esmagadora maioria dos chamados “best-sellers” são obras que, quando “espremidas”, pouco ou nenhum “sumo” deitam.
E como não sou filiado em partido algum, nem tão pouco tenho “padrinhos” ou “afilhados” inseridos ou ligados ao mundo das edições – ou a qualquer outro mundo!... -, como não faço parte de nenhuma organização secreta ou “discreta”, nem sou vedeta televisiva, foi com grande satisfação – e surpresa!... - que recebi os prémios mencionados.
No entanto, aproveitando a deixa de não ter “padrinhos” e de não ser vedeta televisiva, permitam-me que faça somente este reparo: praticamente nenhum meio de comunicação social referiu o sucedido. Tirando alguns periódicos locais e um jornal on-line, não tive conhecimento da divulgação do sucedido na imprensa de grande tiragem, nem tão pouco nos programas televisivos de informação… Talvez tudo isto se deva à ausência de um “cartão de sócio” de algum partido na minha carteira – ironicamente falando.
Quanto a um novo “projecto”… Pois, como diz o adágio, “o segredo é a alma do negócio”!... Posso, no entanto, adiantar que tenho vários guardados na gaveta, à espera de verem a luz do dia. Veremos, então, o que o futuro me reserva.
Marta: Pretende manter-se na linha dos romances históricos, ou gostava de se aventurar num estilo diferente?
Luís Corredoura: A questão dos chamados “romances históricos” é-me mais cara p’lo facto de, ao longo de toda a vida, ter “acumulado” informação que me facilita entrar em determinada época e aí desenvolver certo enredo. No entanto, assumo que tenho um ou outro “projecto” em gaveta que não se centra tanto na componente histórica, mas, sim, na vivência contemporânea, nos dias que vamos vivendo.
De qualquer modo, reconheço que me sinto mais à vontade no passado e até na chamada distopia, na realidade paralela, no “what if”, conforme os anglo-saxónicos designam o que não sucedeu, mas que podia ter acontecido, não fosse um casual capricho ou situação aparentemente insignificante, do que nos tempos correntes. Talvez isto suceda devido ao facto de haver demasiada “poeira” no ar por estes dias, desinformação, contra-informação e afins que só nos confundem. Há que deixar o pó assentar para, então, termos uma visão mais focada e concreta do que sucede e/ou aconteceu. Talvez seja também por isso que gosto de História. Não sou um saudosista, nem quero um regresso do passado; sou, sim, alguém que quer saber o que aconteceu para melhor poder preparar o que está para vir.
Luís, muito obrigada pela sua participação, e pela sua disponibilidade para esta pequena entrevista!