A "polémica" disciplina de Cidadania
Ainda me lembro quando, há alguns anos, vi umas letras estranhas "ETC" no horário da minha filha, e não fazia a mínima ideia do que aquilo significava.
Depois, lá explicaram que era uma nova disciplina "Ética e Cidadania". Não contava para nota, mas era de frequência obrigatória.
Como era leccionada pela directora de turma, o que acontecia muitas vezes era tratar-se, nessa aula, de assuntos relacionados com a turma.
Fora isso, o que foi abordado passou muito pelo respeito pelos outros, igualdade, bullying, preservação do ambiente, e por aí fora.
É por isso que me faz alguma confusão toda esta polémica que se está a gerar à volta de disciplina, agora apelidada de Cidadania e Desenvolvimento, que teve início quando uns pais decidiram proibir os filhos de frequentá-la, com o argumento do direito de objecção de consciência.
Apesar de, na minha opinião, a disciplina abordar diversos temas pertinentes e úteis, e poder ser um complemento à educação parental, estes pais consideram que a educação para a cidadania é uma competência deles, e mostram preocupação com dois módulos em específico - "Educação para a igualdade de género" e "Educação para a saúde e sexualidade" - que fazem parte da disciplina em questão, entendendo que a educação sexual e de género têm cariz moral, e não competem à escola. Como tal, defendem que ela deveria ser facultativa, tal como a Educação Moral e Religiosa.
O caso tem tomado tais proporções, que já existe um processo de promoção e protecção para estes jovens e, neste momento, o Ministério Público pretende mesmo que estes alunos fiquem à guarda da escola durante o ano lectivo.
A discussão faz-se no Tribunal, e fora dele, com vozes a favor e contra.
Para mim, a disciplina deveria ser facultativa. É o mais lógico.
Não sendo, não vejo qualquer problema nos conteúdos que aborda, embora admita que nem todos os pais o vejam dessa forma, e se sintam confortáveis com os mesmos, e com a forma como é ministrada a disciplina.
No entanto, o que vejo aqui, são dois polos extremistas.
Os pais querem proibir os filhos de frequentar a disciplina. A escola quer obrigar os alunos a frequentar.
Nenhum dos dois está bem.
Nenhum dos dois está a considerar a liberdade, a vontade e o futuro de quem acaba por ser mais prejudicado, no meio desta "guerra".
Já alguém perguntou, a esses mesmo alunos, se querem frequentar a disciplina?
Já alguém pensou em chegar a um consenso?
Parece aqueles casais que usam os filhos como arma de arremesso e chantagem, um contra ao outro, em vez de, juntos, zelarem pelo interesse dos filhos, que é o que realmente importa.
Não podemos pensar que os jovens serão, automaticamente, influenciados apenas pelo que ouvem na escola, ignorando tudo o que lhes foi incutido e passado pela educação dos pais.
Por outro lado, acho saudável que os filhos tenham várias visões distintas, que questionem, que debatam, que decidam por si, que lhes seja dada essa liberdade.
E se, agora, os pais começarem a achar que determinadas matérias vão contra os seus princípios, e educação que querem dar aos filhos, vão proibi-los de frequentar essas disciplinas também?
Isso iria tornar-se uma rebaldaria sem sentido.
Agora, não me parece que a escola seja um espaço onde uma seita tenta fazer uma lavagem cerebral aos alunos, levando-os a situações de surtos de ansiedade, pânico, ou crises de identidade.
Da mesma forma, não me parece que o facto de os alunos não frequentarem a disciplina consituia um perigo e prejudique os alunos, a ponto de considerar que é do "superior interesse dos jovens e com potencial a, definitivamente, afastar situação de perigo existencial dos mesmos" obrigá-los a tal.
Considerar que os pais põem em perigo a formação, educação e desenvolvimento dos filhos, e afirmar que há perigo de os jovens sofrerem maus-tratos psíquicos, só pelo facto de não frequentarem a dita disciplina, é esticar muito a corda. Parece-me um exagero, que não entra na cabeça de ninguém.
Preocupassem-se antes com quem está, realmente, em risco e precisa de olhos mais abertos e atentos, e não ocorreriam metade das situações que, infelizmente, acontecem, porque foram ignoradas ou desvalorizadas.
Vamos ver qual será o desfecho desta "novela", sem pés nem cabeça.
No entanto, gostaria de ouvir mais opiniões, não só de pais, cujos filhos frequentaram ou frequentam a disciplina, mas também de professores, quer leccionem ou não a mesma, para ver se conseguia perceber o que levou uma simples disciplina a esta discussão dantesca e que, para mim, não faz sentido.