Esta noite o céu brilhará um pouco mais
"Perder um pilar abana um pouco a estrutura. Mas mantém-se de pé.
Quando se perde os dois, a estrutura desmorona por completo."
O meu pai conseguiu, por duas vezes, surpreender-me.
Recuperar, quando eu acreditava que se estava a deixar ir.
Não sei se lutava por ele, se por nós.
Se se mantinha vivo porque ainda queria viver. Ou se por saber que estávamos a fazer de tudo para que vivesse.
Mas a vida é efémera.
Já sabemos disso.
E, quando o que separa a vida, da morte, é o sofrimento, e a dor; quando se passa a viver numa realidade à parte; quando apenas se existe; então, desistir é o melhor a fazer.
O meu pai já viveu tudo o que tinha a viver.
Já só queria que a morte o levasse.
Quem sabe, para junto da mulher.
Em duas semanas, tudo mudou.
De repente, o meu pai deu lugar a um "vegetal", alguém que já não conseguia falar o que quer que fosse, alimentado por uma sonda, drogado e preso a uma cama de hospital.
Aí, percebemos...
E, embora já estivessemos mentalizados, nunca pensámos que a notícia chegaria tão cedo.
Não me cheguei a despedir.
Mas recordo o último momento que passei com ele. Escassos minutos em que comeu aquilo que mais gostava: uma fatia de bolo!
Um último esforço, por mim.
Antes de ser levado para o hospital.
Ainda consciente. E ciente.
O meu irmão, não teve a mesma sorte.
Foi visitá-lo ontem, e viu um outro pai.
Um pai que estava a horas da morte. Ainda que não o soubesse.
O meu pai acreditava em Deus.
Então, quero acreditar que Deus lhe fez a vontade, e o levou, na hora certa.
Evitando passar por tudo aquilo que ele não queria, e dar trabalho e preocupações a quem ele não queria.
O meu pai era um ser humano extraordinário (mas eu sou suspeita)!
Um pai sempre presente.
Com quem aprendi muito do que hoje sei. E me fez o que hoje sou.
Com quem vivi imensas aventuras.
Generoso. Desprendido do que não tinha valor.
Influenciou-me de várias formas, e uma delas foi a escrita.
Então, não poderia homenageá-lo de outra forma.
E porque ele adorava fazer as suas reflexões, a observar o mar, esta será, talvez, a imagem que mais espelha a sua despedida deste mundo, antes de ascender a um qualquer outro plano, que lhe esteja reservado.
Até sempre, pai!