Histórias Soltas #15: Dias bons, dias maus
O despertador tocou.
Uma vez. Outra vez.
Mecanicamente, Sara desligou o alarme de cada vez que ele soou.
Agora, já não tocaria mais.
Sabia que tinha que se levantar, mas não queria arriscar sair da cama, e enfrentar outro dia como o anterior.
Sara tinha dias bons, e dias maus.
O dia anterior tinha sido um desses dias maus, em que a dor de cabeça a tinha atirado para a cama, para um quarto escuro, e para o silêncio.
Silêncio relativo, já que se ouvia os filhos dos vizinhos na rua a gritar enquanto brincavam e, só mais ao final do dia, o som lá de fora se limitou ao canto dos pássaros.
Ainda tinha tentado levantar-se, e fazer alguma coisa em casa mas, poucos minutos depois de estar de pé, as dores voltavam com o dobro da intensidade, e a indisposição não lhe permitia continuar a insistir.
Nestes dias, em que Sara resistia, heroica ou estupidamente, a tomar um comprimido que fosse para aliviar as malditas enxaquecas, a solução era mesmo deitar-se, e esperar que no dia seguinte as dores tivessem passado, e ela pudesse voltar aos dias bons.
No entanto, as crises tinham começado a tornar-se mais prolongadas, mais fortes, e ultimamente, o dia seguinte era apenas sinónimo de uma melhoria, não de restabelecimento total.
A culpa era sua, bem sabia.
Sara já conhecia bem os gatilhos que despoletavam as crises e, por isso, sabia bem que deveria evitá-los o mais possível.
Sabia que deveria evitar locais demasiado movimentados, abafados e barulhentos, como os centros comerciais, por exemplo.
Que não deveria deitar-se muito tarde, ou dormir até tarde.
Que não deveria ver televisão durante várias horas.
Que o sol intenso, a luminosidade excessiva ou odores fortes poderiam ser o suficiente para a deixar mal.
Ela sabia tudo isso. Mas há coisas que nem sempre dá para evitar.
E que nem sempre ela queria evitar.
Depois, restava-lhe aceitar o “castigo”, que se vinha a tornar mais penoso.
Ela, que nunca tinha sido mulher de beber cafés, até esse truque tentava, sem efeito.
Desta vez, ponderou mesmo tomar um comprimido para atenuar as dores.
Mas a noite chegou, conseguiu dormir e, agora, era um novo dia.
Com pouca vontade, levantou-se.
Aparentemente, estava bem. As dores tinham passado. A indisposição também.
Parece que, afinal, seria um bom dia.
Ou assim o esperava Sara…