Histórias soltas #2
"Estou grávida.
Maldita a hora em que me deixei levar por uns minutos de prazer, enfeitiçada por palavras ocas, vãs.
Já devia saber que era eu que ia acabar por sofrer as consequências. Somos sempre nós. Eu bem vejo, pelas outras mulheres, como é que as coisas são.
Quando um filho ainda é apenas um plano a longo prazo, os homens dizem sempre que vai ser uma experiência enriquecedora e gratificante, que nos vão ajudar em tudo,que vão ser os melhores pais do mundo. Mas, depois, quando os filhos se tornam reais, fogem das responsabilidades, das tarefas, dos problemas. Afinal, nós é que somos as mães, nós é que temos a obrigação de cuidar dos filhos. Em último caso, nós é que engravidámos e somos, por isso, culpadas. Temos que aguentar. Nós é que temos que pagar o preço. E o mais engraçado, o mais irónico, é que nem sequer tive prazer!
Estou grávida e não quero este filho. Nunca quis. Gosto muito da vida que tenho, e não quero estragá-la com esta criança. Não gosto de crianças. Não tenho jeito. Não tenho paciência.
Infelizmente, descobri tarde demais que estava grávida. Não pude interromper a gravidez de forma legal e, confesso, tive algum receio de fazê-lo clandestinamente. Por isso, tenho que aguentar até este bebé nascer, para me livrar dele.
Não me interpretem mal. Não me condenem. Simplesmente, não sirvo para ser mãe.E não quero passar pelo mesmo que as outras mães - ficar sozinha, com uma criança nos braços, para criar. Sozinha, sim! Porque a conversa dos homens não passa disso mesmo - conversa fiada para conseguirem o que querem.
Nunca iria ser uma boa mãe, tenho a certeza. Iria sempre olhar para aquela criança como um fardo, como um erro, como a culpada pelo fracasso em que a minha vida se iria tornar.
Já falta pouco para sair de dentro de mim. Já falta pouco para o pesadelo terminar.
O que será deste bebé, nem quero saber. Prefiro não saber.
A partir do momento em que sair do meu ventre, das minhas mãos, já não será um problema meu."