Isto não é trabalho, é escravatura disfarçada!
Estão a ver aquela pessoa mesmo branquinha, que não pode apanhar um bocadinho de sol que fica logo vermelha, que usa sempre protector solar factor 50, e leva sempre chapéu de sol para a praia, para se proteger?
Estão a imaginar essa mesma pessoa, enviada para uma espécie de deserto sem qualquer protecção e sem saber para o que ia, estar cerca de 10 horas exposta ao sol, sem poder sair de onde está, a não ser quando lhe derem autorização, caso precise ir à casa de banho, ou na sua escassa meia hora de almoço, únicos momentos em que lhe é permitido sentar-se?
Como é que acham que essa pessoa chegará ao final do dia?
Com sorte, com um valente escaldão e sem se poder mexer. Com azar, sujeito a ir direitinho ao hospital, com desidratação, queimaduras de pele, cefaleias, tonturas, febre e, em casos mais graves, perda de consciência.
Como já perceberam, embora ambos os casos fossem graves, isto não aconteceu, como seria de esperar em pleno Agosto, em diversão, numa praia ou numa piscina. Foi mesmo em trabalho.
Que empresa é esta que coloca os seus funcionários a trabalhar nestas condições, neste caso, total falta de condições, sem qualquer protecção? Qual é a empresa que permite que um funcionário seu seja obrigado a estar 10 horas de pé, sem qualquer abrigo, sem o avisar para levar um chapéu ou protector solar, e garrafas de água?
E ainda vêm cá dizer que compensa? Compensa para eles, que não passam por metade daquilo que os funcionários passam.
O meu marido saiu do trabalho anterior porque era, psicologicamente, desgastante. Porque tinha que trabalhar vários dias a 12 horas, para poder ter uma folga, e o ordenado não compensava.
Contrataram-no para um posto provisório, que seria de 8 horas, com folgas aos domingos e dois sábados por mês, além dos feriados, até Junho, sendo que depois lhe arranjariam um posto fixo, de preferência mais perto de casa. Promessas...
A realidade foi ter que começar a trabalhar aos sábados e, inclusive, um feriado, ficando com a única folga ao domingo.
A realidade, foi fazerem-no andar a saltitar de posto em posto, a gastar dinheiro em gasolina e portagens, para trabalhar de 10 a 12 horas por dia, para postos que não ficam nada perto de casa.
A realidade, foi ter que, muitas vezes, gastar dinheiro a comer fora, ou comprar comida por ali, por não saber que condições iria encontrar.
A realidade, foi dizerem-lh o horário que iria fazer nos próximos dias, num dia, e no seguinte alterarem-lhe a vida toda.
Mas a gota de água foi mesmo o último posto em que foi colocado.
Que tenha que trabalhar mais horas que o suposto, custa, mas ainda se faz. Que não tenha computador ou televisão para se entreter, mas tenha ao menos uma cadeira, e um sítio onde comer, também se aguenta. E até se aguentava, com esforço, estar várias horas de pé, desde que no interior.
Mas ter que ficar 10 horas debaixo de sol, em pé, com mau ambiente entre colegas de trabalho, valendo-lhe unicamente os homens da obra, que lhe foram dando garrafas de água para não desidratar, e chegar a casa de tal forma que até metia medo, só de olhar, sujeito a ter problemas graves de saude, não se admite. É desumano. Se todas as empresas têm que ter condições mínimas para os funcionários, onde estavam elas neste caso?
E se acontecesse algo de grave, quem é que assumia a responsabilidade?
É revoltante...
Ah e tal, a empresa só tem postos bons. Tinha, há anos atrás. Agora, não me parece.
Ah e tal, a empresa só tem postos de 8 horas. Mentira! Pelos vistos, agora fazem mais.
Ah e tal, a empresa paga bem. Já lá vai o tempo! Agora, paga o mesmo que as outras, por mais tempo de trabalho.
E quem diz esta, diz outras.
Trabalhos em part time, de 8 horas, a receber 600 euros, trabalhos de 12 horas, de segunda a sábado, a ganhar 800 euros, e por aí fora, é o que mais se encontra hoje, quando se anda à procura de trabalho.
Dizem que a escravatura já acabou há muito tempo. Pois não parece que seja verdade. O que me parece, é que ela continua a existir, mas de outra forma, mais disfarçada!