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Marta O meu canto

Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada... Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!

Marta O meu canto

Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada... Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!

Da guerra...

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A guerra…

Procurei, calmamente, escapar dela.

Eu.

A minha família.

Os meus amigos.

E todos aqueles que aqui estavam, tranquilamente, a viver a sua vida.

 

Não a antevi. Não a percebi.

Para falar a verdade, nem sequer a concebi. Não a imaginei.

E, no entanto, parece que ela estava implícita.

Nas entrelinhas que não vi.

Nas letras pequeninas que ignorei.

 

Falava-se disso, é certo.

Mas acontecer mesmo, não acreditava.

Não queria acreditar.

Até ao dia em que aconteceu.

E percebi que era real.

 

A guerra…

Procurei, racionalmente, contorná-la.

Tentei esconder-me. Mas não o consegui fazer.

Arrisquei enfrentá-la. Afinal, sou forte.

Mas ela fintou-me.

E avisou-me do que me esperava, se continuasse.

 

A guerra…

Procurei, seguramente, afastar-me dela.

Deixando tudo para trás.

Anos de vida. De lutas. De conquistas.

Tudo o que tinha construído. Alcançado.

Não havia tempo.

 

A guerra…

Procurei, apressadamente, salvar-me. E aos meus.

Com o receio, a angústia, e a tristeza a inundar-me.

Com a sensação de perda. De fracasso. De luto.

De lágrimas nos olhos. O coração, nas mãos, apertado.

E uma dor no peito, impossível de descrever.

 

A guerra…

Porque é que, simplesmente, não nos deixam?

Porque é que, simplesmente, não nos respeitam?

Porquê, nós?

Sempre os mesmos.

Os que ficam. Os que partem. Os que já nada podem fazer.

 

A guerra…

Procurei, desesperadamente, fugir dela.

Mas, por mais que fuja, ela persegue-me.

Nenhum lugar é seguro.

Mesmo que assim o creia.

Sinto que não passa de uma ilusão.

 

Mesmo quando me dizem que está tudo bem.

Que estou em segurança, e já não corro perigo.

Sinto que, a qualquer momento, uma bomba pode rebentar.

Um míssil pode cair.

A morte me pode levar.

 

A guerra…

Procuro ter fé. Ter esperança.

Acreditar que o pior já passou.

Que já não corremos perigo.

Mas não passou.

Porque os traumas ficam para sempre.

 

Os traumas.

As marcas.

O medo.

A destruição à nossa volta.

O que se perdeu, e já não se recupera.

 

Perde-se a liberdade.

Perde-se a inocência das crianças.

Perde-se a alegria.

Perde-se a segurança.

Perde-se um povo.

 

A guerra…

Procuro, deste lado, acreditar que vai acabar.

Com um sentimento de gratidão.

Por ter tido a oportunidade de sobreviver.

Ou, quem sabe, desolação.

Por ter perdido os meus, pelo caminho.

 

Do outro lado, os que ficaram de livre vontade.

Para defender a nossa terra.

Ou foram obrigados a ficar.

Para lutar nesta guerra.

Com as armas que têm, e que não têm.

 

A guerra...

Espero, um dia, regressar.

À minha terra. Ao meu país. 

Ter tempo para recomeçar a vida, que ficou suspensa.

Até lá, resta rezar para que mais nenhum inocente sofra.

Nesta guerra que nunca quisémos. E nunca pedimos...

De que servem os nossos ideais se não nos permitirem dar uso a eles?

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Quando alguém escolhe uma determinada profissão, como polícia, advogado, investigador, juíz, médico ou outra qualquer que esteja, de alguma forma, directa ou indirectamente, relacionada com o sentido de justiça e verdade, escolhe-a, porque acredita que pode lutar por esses ideais e dar o seu contributo.

 

É para isso que trabalha e dedica a sua vida, sabendo que está a fazer o que é certo, o que é correcto. Mas, muitas vezes, os nossos ideais de nada nos servem. 

Muits vezes, ficamos de pés e mãos atadas, porque existem forças mais importantes que os nossos ideais. Para as quais, esses ideais, servem para pisar por cima e pôr no lixo.

 

O que fazer, então, nesses momentos em que percebemos que, para manter o nosso trabalho e fazer aquilo que gostamos, temos que ignorar o que está bem diante dos nossos olhos, e compactuar com o oposto daquilo pelo qual lutamos?

Quando de nada adianta saber a verdade, se a nossa vida depende de a ocultarmos ou não?

Quando o nosso trabalho deixar de nos dar prazer, para apenas nos causar angústia, vergonha, impotência?

Quando não podemos dar uso aos nossos ideais, e somos obrigados a fechá-los numa gaveta?

 

 

Para alguns, para quem a situação se torna insustentável, a resposta é simples...

Sair!

 

 

 

(inspirado na série La Victima Número 8, da Netflix)

Bullying? O que é isso?

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"O mundo é um lugar perigoso, não só por causa daqueles que fazem o mal, mas também por causa daqueles que observam, e deixam o mal acontecer."

 

"Bullying?"  

"O que é isso?"

"Cá não há nada disso."

"São jovens, têm que resolver as coisas entre eles."

 

Por incrível que pareça, ainda se ouvem muitas vezes estas e outras expressões similares quando falamos de bullying.

A propósito de um documentário sobre o bullying nas escolas, dizia o meu marido que as coisas agora estão melhores. Diferentes, acredito, Melhores, tenho dúvidas.

Na escola da minha filha foi-nos dito pelo director de turma, que nós, pais, não devemos minimizar as situações, que devemos estar atentos aos sinais e agir, ainda que por mero descargo de consciência. E aos alunos, foi dito para não terem medo, para conversarem com os professores, para denunciarem, para não temerem. Até existe uma espécie de caixa do correio onde as vítimas de bullying podem colocar por escrito os seus problemas, de forma anónima.

Se, na prática, as medidas funcionam? Não faço ideia. Mas, pelo menos, assumem que o problema existe e que, teorica e aparentemente, se preocupam com ele. Porque o bullying existe, não é uma brincadeira de crianças, magoa, faz sofrer e pode levar ao suicídio, como já aconteceu.

Nesse documentário que referi, diziam os representantes das escolas: "Não podemos evitar que eles falem, não os podemos vigiar 24 horas por dia..." ou então "São os pais que devem falar com os filhos em casa". E assim se desculpam pela inércia, e lavam as mãos.

Uma das cenas que mais me irritou, foi ver uma directora chamar dois alunos (vítima e agressor), e pedir que dessem um aperto de mão para resolver o assunto. O agressor estendeu a mão. A vítima, no início, não. Depois, fê-lo contrariado. A directora, considerou que o comportamento da vítima não era correcto, que o aperto de mão não tinha sido sincero, e chegou mesmo a afirmar que a vítima, ao agir dessa forma, estava a ser igual ao agressor!  

Como é possível ouvir alguém dizer isso? Então era suposto a vítima, que todos os dias sofre, é humilhada e agredida, aceitar um aperto de mão "para inglês ver" como pedido de desculpas, sabendo que nada ficou resolvido? Que tudo vai continuar igual? A vítima é que é a "má da fita"? A vítima é que tem de se rebaixar ainda mais? É inadmissível!

Uma outra família, falava do seu filho de 13 anos. Anos esses que não têm sido, de todo, fáceis. Cada dia que vai para a escola, é um inferno. Cada dia que regressa a casa sem que lhe tenha acontecido nada, é uma benção, um "respirar de alívio". 

Num outro episódio, uma estudante do quadro de honra, desportista com várias medalhas e prémios, vítima de bullying, foi presa por sequestro de 25 crianças quando, num acto desesperado e depois de provocada, decidiu apontar uma arma (que tinha levado de casa) aos alunos que se encontravam com ela no autocarro.

O mais grave, foi o de um menino que não aguentou, e se enforcou no seu quarto. Dizia o pai que compreendia o que tinha levado o seu filho a fazer isso. Actos como roubar a roupa do filho enquanto ele estava no balneário e obrigá-lo a andar nu pela escola, e muitos outros, são pura violência psicológica e que podem destruir qualquer jovem.

Mas, afinal, qual é a origem do bullying? Como é que tudo começa? Será que quem pratica bullying já traz essa prática implantada no seu carácter, na sua personalidade? Será que a educação que recebeu o instruiu para isso? Ou será que se aplica aquele ditado de que "por detrás da pessoa que fere, há sempre uma pessoa ferida"?

E como é que se pode combater o bullying? Ajudar as vítimas? Quem pode fazer o quê?

Acima de tudo, devemos ouvir as vítimas. Saber ouvir, compreender e dar apoio.

Porque se as pessoas, principalmente aquelas que estão mais próximas e que deviam ajudar, minimizam o problema, ignoram, desdramatizam e viram costas, as vítimas fecham-se, calam-se, guardam para si, sofrem sozinhos, e isso pode levá-las a atitudes extremas.

E a responsabilidade deverá recair não só sobre quem praticou, mas também sobre quem viu e nada fez para ajudar. 

Como disse Albert Einstein, "O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer".

 

 

 

A Tica fugiu de casa

 

 

 

A nossa Tica fugiu ontem de casa.

Apanhou-me distraída no espaço de alguns minutos, e saiu pela janela da entrada, que estava entreaberta enquanto a máquina de secar roupa estava a trabalhar.

Quando dei por isso, tinha ela acabado de sair. Fui atrás dela, mas fugiu para um lado. Depois voltou para trás, mas em vez de ir para casa, olhou para mim e saltou para a rua, depois foi para o quintal dos vizinhos e enfiou-se debaixo de uma carrinha. 

Chamei-a, mas nem se mexeu.

Parva, estúpida, palerma, idiota...sei lá o que lhe chamei na altura, irritada como estava por ela ter fugido. Tem tudo cá em casa, é tratada como uma rainha (tomara muitos terem a mesma sorte) e é assim que agradece. Não dá valor à sorte que tem. Pois se não está bem em casa, fique na rua, para onde sempre quis ir. Nós é que somos maus por tentar protegê-la, por evitar que ela vá para a rua sozinha e lhe aconteça alguma coisa.

Os animais são como as pessoas, têm que aprender à sua custa, com os seus erros. Espero é que a lição não lhe saia cara.

Com este estado de espírito só pensava que, quando ela voltasse, ia levar um belo raspanete. E ia ficar de castigo sem ir à rua nos próximos dias para aprender. Depois, pensei em, simplesmente, ignorá-la por uns tempos para ela perceber que nos magoa cada vez que foge de casa.

No entanto, a minha fúria dura pouco, e com o passar das horas, sem ela dar sinal, só quero mesmo que ela volte, para recebê-la de braços abertos, como a um filho pródigo.

Não voltou. Passou a noite toda fora. Uma noite em que, a cada barulhinho, me levantava para ver se ela estava à porta. Sem sucesso. Em que ouvia a chuva lá fora e imaginava onde ela poderia estar - se estaria ao frio, se estaria molhada. Ou se tinha encontrado um abrigo. Se alguém a tinha apanhado, ou se algum cão a tinha atacado, ou algum carro atropelado. Se estaria presa em algum sítio sem conseguir sair.

A essa altura, o meu único desejo era que ela estivesse bem, onde quer que estivesse, mesmo que não voltasse.

De manhã, procurámos nos sítios em que ela normalmente se costuma esconder. Nada. Chamámos por ela, apitámos os seus ratos, agitámos a caixa da ração. Apareceram outros gatos, mas não a Tica.

A verdade é que não há muito que possamos fazer. Não sabemos onde está ou para onde foi. Só podemos esperar que ela apareça, e bem. Foi ela que escolheu o seu caminho. Mas custa-me não saber dela.

Já tentei ser compreensiva, optimista, forte, realista ou indiferente para não descambar. Para não me lembrar que todas as noites ela dormia encostadinha a mim, e esta sabe-se lá onde dormiu. Para não me lembrar do último olhar que me deu antes de saltar o muro e fugir. Para não me lembrar que todas as manhãs estava a postos para receber o dono e ir para a janela da sala, para não pensar na falta que ela faz e como a casa fica mais vazia sem ela...

Pode até parecer um exagero, mas a Tica é como uma filha para mim. E a pior coisa que pode acontecer a uma mãe, é perder um filho...

Podes ficar feliz por mim, mãe?

 

"Recebi hoje as notas das últimas fichas de avaliação que fiz - Bom, Bom, Bom.

Não são más, mas esperava mais. As fichas tinham-me corrido tão bem. Fiquei um bocadinho desapontada. 

O que correu mal? Não sei. Só quando as vir posso ter a certeza se errei mais coisas do que pensava, ou se foi, como a professora disse, um problema de letra que, quem corrigiu, não percebeu.

Agora, está na hora de ligar para ti, mãe, e dar-te as novidades. Não tenho medo que fiques zangada comigo porque, seja qual for a minha nota, tu preferes que eu te diga, sem receio.

Mas sei que, tal como eu (ou mais ainda) vais ficar triste e desapontada. Sei que esperavas pelo menos, Muito Bom a algumas. Não tive.

Sei que te vais sentir frustrada e achar que podias ter feito mais, que vais pensar que, por mais que te esforces por me ajudar, não é suficiente para eu ter melhores resultados.

Mas não é verdade. Tu fazes o melhor que podes e, de certeza, sem a tua preciosa ajuda, sem a tua persistência e paciência, sem o teu apoio e incentivo, as coisas poderiam correr bem pior. 

Se tive as notas que tive, a culpa não é tua. Sou eu que estou na escola, sou eu que estudo e sou eu que tenho a responsabilidade de ter boas notas.

Ainda assim, fiquei satisfeita por não ter tido notas ainda mais baixas, como alguns colegas meus. Posso não ser um génio, a mais inteligente e a melhor aluna da turma, mas também não sou má aluna. E tu sabes que me tenho esforçado neste último ano.

Por isso, podes ficar feliz por mim, mãe? Porque se tu ficares feliz, eu também fico!

E tiro, do meu coração, uma boa parte desta angústia que sinto por ter tido notas mais baixas do que as que ambas esperávamos.

Ah, e preciso também que continues a acreditar, e não desistas, porque eu não quero desistir. E preciso que continues ao meu lado nesta batalha que temos vindo a travar há quatro anos, e que está longe de terminar.

Porque, contigo ao meu lado, sinto-me mais forte e confiante, para alcançar aquilo que mais desejamos!"