Sinais da idade
"Todas as asneiras que fizermos em novos havemos, mais tarde, de pagar por elas."
E o meu pai que o diga!
Acho que, por mais anos que passem, temos tendência a ver os nossos pais sempre da mesma forma, como se esses anos não passassem por eles, ou passassem, mas eles continuassem iguais, sem se notar a passagem do tempo.
Sempre vi o meu pai como uma pessoa activa. Alguém que não consegue estar quieto ou parado muito tempo no mesmo sítio. Alguém que gostava de fazer longas caminhadas.
Mas o tempo, as asneiras, os vários acidentes que foi tendo desde novo, não perdoam.
E, hoje, aliadas a alguns problemas já existentes, condicionam-lhe os movimentos e a vida, provocam-lhe dores, dificultam-lhe as tarefas mais básicas e, ainda assim, volta e meia, lá insiste em fazer mais alguma "asneira" para a qual o seu corpo já não está preparado.
Depois, os ossos, os músculos, os tendões, tudo se ressente.
E a memória começa a pregar partidas.
Afinal, são quase 80 anos.
E a minha mãe?
Mulher activa, também. Ultimamente, não tanto.
Fingimos não perceber, mas é um pisco a comer.
Está magríssima, embora as calças disfarcem.
Mas levá-la ao médico? Só quase arrastada.
Diz que se sente bem. Que não precisa de fazer exames, nem ir ao médico.
As únicas consultas a que vai, são as de oftalmologia, em que é seguida por causa das cirurgias que fez à vista.
Não é mulher de se queixar, de mostrar dores, de fazer fitas. Guarda para ela.
Mas uma pessoa vai-se, aos poucos, apercebendo dos sinais da idade.
Um degrau que ela já tem dificuldade em subir ou descer sem ajuda. Algo que ela já demora a agarrar, não sei se por não ver bem, ou se por outro motivo.
Um dente ou outro que falta, e que lhe dificulta a fala.
Afinal, são 79 anos.
Que bom seria que os nossos pais estivessem sempre novos, apesar do tempo passar.
Que tivessem sempre saúde, enquanto vivessem.
Mas se nem nós, muitas vezes, a temos, e andamos piores que eles, como podemos esperar que eles sejam mais valentes?
É assim a vida.
Sempre a dar sinais.
Sinais das parvoíces que achávamos que não iam ter consequências.
Sinais de que o nosso corpo não é de ferro.
Sinais de que o tempo não pára.
Sinais da idade, que avança a cada ano que passa, para todos nós, e para eles também.