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Marta O meu canto

Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada... Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!

Marta O meu canto

Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada... Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!

Histórias Soltas #30: O feitiço

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Vitusca era uma aprendiz de feiticeira.

Mas não aprendia grande coisa. 

Ansiosa por pôr em prática grandes e poderosos feitiços, acabava por não prestar grande atenção aos ensinamentos que a mestre lhe dava.

Vitusca não gostava de esperar, de perder tempo com explicações, que considerava inúteis, nem com pequenos truques próprios de quem ainda está a começar.

Ela sonhava com grandes feitos.

 

E com Alepus, um colega de turma por quem, desde o primeiro dia, mostrou interesse que, pensava ela, ser recíproco.

Foi, por isso, com espanto, e desagrado que, naquele dia, viu Alepus muito próximo de Nimona.

Como ousou ele? E quem era aquela, que ela nunca tinha visto na vida?

Movida pela raiva, não pensou duas vezes e lançou um feitiço sobre Alepus, transformando-o numa planta.

O que Vitusca não percebeu foi que o seu feitiço tinha atingido, também, Nimona que, agora, era uma borboleta.

Uma borboleta que poderia passar o resto da sua vida pousada na planta.

 

Se ao menos ela tivesse pensado, antes de agir.

Se tivesse prestado mais atenção às aulas.

É caso para dizer que o feitiço virou-se contra a feiticeira!

 

 

Histórias Soltas #29: Dualidades...

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Não sabia bem se era uma pessoa, naturalmente, complicada, ou se alguém que complicava as coisas sem necessidade.

Sabia que não gostava do incerto, de não saber com o que contar.

Não acreditava no destino e, talvez por isso, lhe custasse ainda mais acreditar que, algures no tempo, sem que estivesse à espera, coisas boas viessem a acontecer.

 

Era uma pessoa que gostava de tudo planeado, de saber tudo com antecipação.

Não era propriamente simpatizante de surpresas.

Por isso, aquele compasso de espera, sem saber bem o que esperar, era inquietante.

Sentia uma certa ansiedade.

Uma necessidade de antever o futuro.

A urgência de que tudo acontecesse rapidamente quando, o que mais precisava, sem o saber, era daquele tempo que, agora, lhe tinha sido dado.

 

Ou até sabia.

Sabia que tinha de passar por isso.

Que se tornaria uma outra pessoa.

Que aprenderia com esta nova experiência.

Mas queria fazê-lo sabendo que, lá à frente, haveria algo guardado para si.

 

Como se a vida desse garantias de alguma coisa a alguém.

Que atrevimento esperar que, consigo, fosse diferente!

Quanta petulância, achar que era uma peça diferente das outras, naquele jogo.

 

Enquanto isso, ia levando dia após dia, alimentando-se de histórias fictícias que, ainda que nunca permitissem saborear, deixavam o odor no ar, apaziguando o desejo de, também um dia, voltar a provar.

Mas, para quê?

Se sabia perfeitamente que, mais cedo ou mais tarde, as coisas voltariam a deixar de ter o mesmo sabor da primeira vez?

Para quê querer viver, novamente, algo que sabe que não é para si?

Para quê cair, novamente, no mesmo erro? E arrastar alguém para esses mesmos erros?

 

E, no entanto, continuava a querer!

Enquanto uma voz lhe dizia que não se metesse nisso, uma outra implorava para que ignorasse a primeira.

Até quando viveria nesta dualidade?

Porque é que, para algumas pessoas, parece ser tão fácil? Tão básico? Tão certo?

Mas não, totalmente, para si?

Porque é que, tantas vezes, era uma pessoa que sentia vontade de se enrolar sobre si própria, e assim ficar, como um animal que hiberna, para se poupar, conservando e armazenando energia no inverno, para depois sair da toca na primavera e, outras tantas, parecia não querer nada disso?  

 

Ainda assim, sentia-se uma pessoa grata.

Grata por lhe ser permitido viver, quando via tanta gente, à sua volta, perder essa luta, das mais variadas formas.

Grata por ainda poder experienciar essa confusão de sentimentos, tão típica do ser humano quando, a tantas outras pessoas, lhes foi vetada.

Grata por poder ter uma palavra a dizer, no rumo da sua vida, ainda que não faça a mínima ideia de para onde se dirigir.

Porque, apesar da incerteza, havia uma certeza que ninguém lhe poderia tirar: ainda tinha uma vida a ser vivida!

 

Histórias Soltas #28: Cumplicidade

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Todos os dias, à mesma hora, os via por ali.

A brincar um com o outro, entre risadas, abraços e beijinhos.

E assim ficavam, alguns minutos, até à despedida.

 

Um último abraço.

Um último beijinho.

E um adeus.

Era o momento dela partir, e viver o seu dia.

 

Quando a perdia de vista, também ele seguia o seu caminho.

Também ele teria pela frente um longo dia.

Mas a promessa de que, no final da cada um desses dias, era certo o reencontro.

 

Não era muito comum, nos dias que corriam, ver cenas como aquela.

Mas eram bonitas de observar e presenciar, ainda que de passagem.

A cumplicidade existente entre aqueles dois seres...

 

... um pai, e uma filha!

 

Histórias Soltas #27: O último dia do ano

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Aqui estou...

No último dia do ano.

Sem companhia.

Mas, nem por isso, só.

Por opção. Pelas circunstâncias.

 

Porque, por vezes, é necessário estar connosco próprios. Sem mais ninguém.

Reflectir.

Ou desligar.

Ouvir os nossos pensamentos.

Perceber os nossos sentimentos.

E, nem sempre, no nosso dia a dia, o podemos fazer.

Sem interferências.

Sem ruído.

 

Não é que não goste de companhia.

De festa.

De música, dança e celebração.

De dar as boas vindas ao novo ano.

É só que, muitas vezes, a realidade leva a melhor sobre a esperança e os desejos para o novo ano.

Chegamos a um ponto em que percebemos que, por mais que queiramos ou esperemos que o novo ano seja sempre melhor que o anterior, nem sempre (poucas vezes) isso acontece.

Ou, então, talvez não consigamos, verdadeiramente, perceber, apesar de tudo, as pequenas coisas boas que fazem valer a pena. A sorte que, apesar de tudo, temos a agradecer.

Mas acredito que, também isso, faz parte de nós.

Os dias em que acordamos felizes, bem dispostos, cheios de energia.

Os dias em que o mau humor chega para ficar.

Os dias em que estamos tristes sem qualquer motivo aparente. Ou apenas nostálgicos, sem sabermos bem de quê.

Mas a verdade é que essa melancolia está dentro de nós. 

Os dias em que a ansiedade nos consome, por tudo em geral, e nada em particular.

 

É assim que me tenho sentido...

Nestes últimos dias...

Neste último dia...

 

Este ano não foi fácil. 

E sei que, daqui a pouco, este ano vai ficar para trás.

Adormeço, despedindo-me dele.

Acordarei num novo ano.

Mas nada irá mudar.

Ou, pelo menos, não para já.

Será só mais um dia...

 

E, ainda assim, representa tanto...

Um novo dia.

Um novo ano.

O "virar da página".

Uma nova esperança...

 

Histórias Soltas #26: Emoções desvairadas

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Lidar com uma emoção de cada vez é uma coisa.

Dá tempo para assimilar.

Para tentar compreender.

Para "digerir".

Para contornar, combater ou eliminar.

Com tempo...

 

Lidar com todas ao mesmo tempo, é bem diferente.

Sem que nada o faça prever, elas chegam.

Desvairadas.

Descontroladas.

Desembestadas.

 

Chegam como uma avalanche.

Que arrebata.

Que engole.

Que desnorteia.

 

Num momento, uma euforia que surge, sabe-se lá de onde.

Capaz de fazer pairar. Quase voar.

Acreditar que ainda não é tarde. 

Que tudo pode mudar. 

Que tudo é possível.

Uma leveza, bem estar e paz, carregada de esperança.

Uma euforia que não é habitual. E que se estranha.

Mas sabe bem.

 

No momento seguinte,  uma tristeza sem motivo.

Sem razão.

Aquele aperto no peito.

Aquele nó na garganta.

Lágrimas que caem fora de horas.

Que não fazem sentido.

 

E, quando a montanha russa de emoções para, depois de várias voltas e loopings, tudo volta ao ponto de onde partiu.

A realidade do costume.

O "voltar à Terra".

O corpo a dar sinal de que não se deu bem com toda esta loucura. 

A pedir descanso, para recuperar.

 

E, depois, é como se nada tivesse acontecido.

Nenhuma emoção estranha.

Nada de anormal.

Tudo está no lugar de sempre.

Que, muitas vezes, não é lugar nenhum...