"Lobo Solitário", de Jodi Picoult
Um pai...
Dois filhos...
Um deles quer manter o pai vivo. O outro, nem por isso.
Duas motivações diferentes. Duas perspectivas diferentes. Duas decisões contrárias.
Nesta história, nenhuma está certa ou errada. Ambas estão certas. E ambas estão erradas.
E as decisões que tomam, tomam-nas pelas razões certas, e pelas erradas.
Porque, quando se tomam decisões que dizem respeito a terceiros, é mais fácil pensar naquilo que nós próprios queremos, e em como as mesmas nos afectarão, do que pensar naquilo que esses terceiros desejariam, e em como eles se sentiriam.
Se deixássemos de pensar em nós, e pensássemos apenas na pessoa que é a principal visada e interessada, talvez as decisões fossem mais acertadas, e menos difíceis de tomar.
Mas o ser humano é egoísta por natureza. E é com base nesse "egoísmo", que teima em justificar as suas acções e decisões, pelo fim a que as mesmas levariam e que, para ele, é o único fim possível.
No entanto, pior ainda que agir, ou decidir, é optar por não fazê-lo, esperando que outro o faça por si.
Deixar uma qualquer decisão nas mãos de outra pessoa retira, a quem não a quer tomar, a responsabilidade e o peso que a mesma acarretaria, ao mesmo tempo que lhe concede o argumento necessário para culpar quem a tomou por si, ou em nome dos dois.
É uma atitude cobarde. Mas, tantas vezes posta, em prática...
Uma mãe...
Dois filhos...
Um que fugiu de casa há seis anos, sem ela saber bem porquê, e que não vê desde então. Outro que preferiu ir morar com o pai, com quem se sentia bem.
E que, agora, regressam, ao mesmo tempo, pela mesma razão, para junto da mãe. Por força das circunstâncias. Embora cada um queira voltar à sua vida o mais depressa possível.
Dois filhos que a disputam entre si. Que procuram nela uma aliada.
Dois filhos que precisam dela mais do que nunca mas, ajudando um, estará a afastar o outro.
Como provar que ama igualmente os dois?
Dois irmãos...
O reencontro após seis anos de ausência, traz com ele toda a mágoa, toda a recriminação, todo o ressentimento.
Se houve um dia em que foram companheiros, e amigos, hoje que estão em lados opostos.
Um, luta pela vida, ainda que essa possa não vir a existir da forma como gostaria. Uma vida sem dignidade. sem liberdade. Uma vida de dependência. Uma vida à espera da morte.
O outro, luta pelo direito a uma morte digna. Pela satisfação de um antigo desejo formulado pelo pai. Pelo salvamento de outras pessoas que ainda possam ter esperança numa vida melhor.
Pode alguém conviver diariamente com uma pessoa e, ainda assim, perceber que, ao contrário do que pensava, não a conhece minimamente?
Pode alguém ausente, ainda assim, conhecer mais uma pessoa que não vê há anos, do que aqueles que lhe são mais próximos?
Uma mulher...
Uma nova família, um novo recomeço. Um novo marido. Dois novos filhos.
E, quando tudo parecia perfeito, o passado volta a bater à porta. Como dividir-se em duas? Em quatro? Em cinco? Ou, até mesmo, em seis, sem deixar de ser ela própria?
Como agradar a uns, sem desagradar a outros?
E os lobos...
Esses seres tão peculiares, que nos são dados a conhecer mais profundamente nesta história.
A forma como se organizam dentro da alcateia. Como protegem a sua família.
Como se guiam pelo instinto de sobrevivência, pelo sentido de responsabilidade, pelo dever.
A forma como ensinam as suas lições, como marcam as suas posições.
Como comunicam. Como sentem. Como reagem entre si, e como interagem com os humanos.
Adorei o livro, e estas foram algumas das frases que destaco desta leitura:
“Não importa o que fazes por alguém, não importa se lhe dás o biberão em bebé, ou se te enroscas com ele à noite para o manter quente, ou se lhe dás comida para que não tenha fome… Dá um passo errado na altura errada e tornas-te irreconhecível.”
“Podemos tirar o homem da natureza selvagem, mas não podemos tirar a natureza selvagem do homem.”
“Após dois anos a viver com os lobos, tinha-me esquecido da quantidade de mentiras que é precisa para construir um relacionamento. Há uma honestidade no mundo dos lobos que é libertadora. Mas aqui, entre os humanos, havia tantas meias-verdades e mentiras inofensivas que era demasiado difícil lembrar o que era real e o que não era.”