"Para a Minha Irmã", de Jodi Picoult
Esta deve ser uma das poucas histórias que, de certa forma, nos deixa de "pés e mãos atados", sem conseguir tomar partido, com absoluta convicção, de nenhum dos lados.
Sabemos o que está errado. Sabemos o que é errado. Sabemos quem está mal.
Mas...
Como podemos julgar? Como podemos condenar?
Quem não faria tudo o que pudesse para salvar um filho?
O problema é, a que preço?
O que implica, e como se repercute, em toda a família, toda a dinâmica estar centrada na filha doente. Tudo depender, e ocorrer, em função dela.
Enquanto isso, há um filho, claramente, negligenciado, "chutado para canto", como se fosse, nem digo uma personagem secundária, mas um mero figurante.
E há uma filha, na qual depositam todas as esperanças de cura, feita à medida, por encomenda, e da qual, ano após ano, desde o seu nascimento, vão "roubando" um pedacinho, como sanguessugas, até não haver mais o que retirar.
Ou até não ser mais preciso.
Kate, a filha doente, é uma sobrevivente.
Talvez, como dizem, esteja apenas à espera que os pais lhe permitam partir mas, como eles insistem tanto que ela se mantenha viva, ela faz o que pode, e o que não pode, para não os defraudar, e vai aguentando tudo, com resiliência.
Uma resiliência que Anna sempre demonstrou, também, porque, afinal, era a sua irmã, e estava nas mãos dela ou, literalmente, no corpo dela, salvá-la.
Mas chegou a um ponto em que, para ela, se calhar, chega.
Se calhar chega, de nunca lhe perguntarem como ela se sente. De nunca lhe pedirem autorização. De a usarem. De não pensarem, por uma vez que seja, nela.
Compreendo o lado dos pais.
Viram naquela filha a única hipótese de salvarem a outra, à partida, sem grandes riscos para a dadora, e com o mínimo benefício que fosse, para a receptora, prolongando um bocadinho mais a sua vida.
Compreendo que uma mãe, perante uma filha com uma doença com esta gravidade, esqueça tudo o resto e apenas esteja focada em não deixar a filha morrer.
Mas ela tem outros filhos!
O pai, por outro lado, é uma pessoa mais sensata, mais razoável. Apoia a mulher, mas questiona-se sobre o que estão a fazer. Se será certo. Se deveriam fazê-lo.
É a pessoa que consegue agir com alguma lucidez, e discernimento, apesar do drama que também é dele.
Obviamente, nenhuns pais vão pedir permissão a um bebé, ou uma criança, para algo que ela própria não sabe bem o que é.
Mas a verdade é que a pessoa mais afectada, Anna, também tem direito ao seu corpo. A não ser invadida. A não ser usada sem o seu consentimento. A não pôr a sua saúde em risco, por menor que seja esse risco, sem estar devidamente informada, e querer, ainda assim, fazê-lo.
A não ver a sua pessoa, e a sua vida, anuladas, porque o que importa é, apenas e só, Kate.
É disto que se trata.
E, chega um momento, em que é preciso parar.
Com um processo de emancipação em curso, interposto por Anna, e a pressão e culpabilização constante da mãe para que ela mude de ideias, toda a história se vai desenrolando, entre reuniões, tutora e advogados, sem sabermos qual será a decisão final do juiz.
E confesso que, depois de tudo, não gostei do final.
Para mim, não fez sentido.
Mas, afinal, também a vida é assim.
Sinopse:
"Luke Anna não está doente, mas até parece estar. Aos treze anos, já fez inúmeras cirurgias e transfusões para que Kate, a sua irmã mais velha, possa combater a leucemia que a afeta desde a infância. Anna foi concebida para ser dadora de medula compatível com Kate, uma vida e um papel que ela nunca questionou...até agora. À semelhança da maior parte dos adolescentes, Anna começa a questionar quem realmente é. Mas, ao contrário da maioria dos adolescentes, sempre foi definida em função da irmã. E é então que Anna toma uma decisão impensável para a maioria das pessoas, uma decisão que faz com que a sua família desmorone e que pode ter consequências fatais para a irmã que ela adora.
Para a Minha Irmã questiona o que significa ser um bom pai ou mãe, uma boa irmã, uma boa pessoa. Será moralmente defensável fazer qualquer coisa para salvar a vida de uma criança, mesmo que isso implique desrespeitar os direitos de outra? Valerá a pena tentar descobrir quem se é de facto, quando essa pergunta nos faz gostarmos menos de nós próprios? Deveremos seguir o nosso coração, ou deixar-nos conduzir por outros?"