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Marta O meu canto

Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada... Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!

Marta O meu canto

Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada... Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!

Histórias Soltas #29: Dualidades...

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Não sabia bem se era uma pessoa, naturalmente, complicada, ou se alguém que complicava as coisas sem necessidade.

Sabia que não gostava do incerto, de não saber com o que contar.

Não acreditava no destino e, talvez por isso, lhe custasse ainda mais acreditar que, algures no tempo, sem que estivesse à espera, coisas boas viessem a acontecer.

 

Era uma pessoa que gostava de tudo planeado, de saber tudo com antecipação.

Não era propriamente simpatizante de surpresas.

Por isso, aquele compasso de espera, sem saber bem o que esperar, era inquietante.

Sentia uma certa ansiedade.

Uma necessidade de antever o futuro.

A urgência de que tudo acontecesse rapidamente quando, o que mais precisava, sem o saber, era daquele tempo que, agora, lhe tinha sido dado.

 

Ou até sabia.

Sabia que tinha de passar por isso.

Que se tornaria uma outra pessoa.

Que aprenderia com esta nova experiência.

Mas queria fazê-lo sabendo que, lá à frente, haveria algo guardado para si.

 

Como se a vida desse garantias de alguma coisa a alguém.

Que atrevimento esperar que, consigo, fosse diferente!

Quanta petulância, achar que era uma peça diferente das outras, naquele jogo.

 

Enquanto isso, ia levando dia após dia, alimentando-se de histórias fictícias que, ainda que nunca permitissem saborear, deixavam o odor no ar, apaziguando o desejo de, também um dia, voltar a provar.

Mas, para quê?

Se sabia perfeitamente que, mais cedo ou mais tarde, as coisas voltariam a deixar de ter o mesmo sabor da primeira vez?

Para quê querer viver, novamente, algo que sabe que não é para si?

Para quê cair, novamente, no mesmo erro? E arrastar alguém para esses mesmos erros?

 

E, no entanto, continuava a querer!

Enquanto uma voz lhe dizia que não se metesse nisso, uma outra implorava para que ignorasse a primeira.

Até quando viveria nesta dualidade?

Porque é que, para algumas pessoas, parece ser tão fácil? Tão básico? Tão certo?

Mas não, totalmente, para si?

Porque é que, tantas vezes, era uma pessoa que sentia vontade de se enrolar sobre si própria, e assim ficar, como um animal que hiberna, para se poupar, conservando e armazenando energia no inverno, para depois sair da toca na primavera e, outras tantas, parecia não querer nada disso?  

 

Ainda assim, sentia-se uma pessoa grata.

Grata por lhe ser permitido viver, quando via tanta gente, à sua volta, perder essa luta, das mais variadas formas.

Grata por ainda poder experienciar essa confusão de sentimentos, tão típica do ser humano quando, a tantas outras pessoas, lhes foi vetada.

Grata por poder ter uma palavra a dizer, no rumo da sua vida, ainda que não faça a mínima ideia de para onde se dirigir.

Porque, apesar da incerteza, havia uma certeza que ninguém lhe poderia tirar: ainda tinha uma vida a ser vivida!

 

Enquanto espero...

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... aproveito uma aberta, e procuro um banco de jardim, onde me possa sentar, e aquecer ao sol, num dia tão frio.

Por incrível que pareça, tempo não me falta.

Pelo contrário, parece ser tempo a mais, ainda que nunca o seja.

É irónico que esteja sempre a queixar-me de que me falta tempo e, quando o tenho, não o possa aproveitar como gostaria, e só queira vê-lo passar depressa.

 

Por mim, passam pessoas. 

Estudantes, num qualquer intervalo entre aulas, ou já com o dia terminado.

Acompanhantes que, tal como eu, tentam ocupar o tempo.

Funcionários, que aproveitam a pausa para petiscar, ou fumar um cigarrinho.

Pacientes, que vão, ou vêm, de alguma consulta.

Familiares que chegam para visitas.

 

Poucos se atrevem a sentar.

Afinal, os bancos estão molhados da chuva que, pouco tempo antes, tinha caído.

O vento também não convida a ficar parado muito tempo.

Mas eu, deixo-me estar.

Ali, posso respirar. Aliviar a dor de cabeça. Abstrair.

 

Olho para o céu.

Nuvens brancas percorrem-no, em passo apressado.

Também não querem ficar ali muito tempo.

E quem quer?

 

O sol vai aproveitando os seus últimos minutos de esplendor.

A caminho, vêm as nuvens negras que, depressa, o esconderão.

Tiro, para memória futura, uma fotografia daquele pedacinho de paz, no meio da incerteza que me aguarda.

Levanto-me, e dirijo-me de volta ao caos, para me proteger da chuva que não há-de tardar a cair.

 

E espero...

Abrigada de uma intempérie. Desabrigada de outra.

Eu, e tantas outras pessoas. 

 

 

O Natal são as pessoas com quem estás!

(Desafio Contos de Natal)

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Tita ficava sempre de mau humor nesta altura do ano.

Parecia que as pessoas eram contagiadas por algum vírus, que as fazia andar eufóricas e animadas mas, ao mesmo tempo, stressadas, numa correria desenfreada para enfeitar tudo, planear almoços e jantares, e comprar mil e uma prendas, para toda a gente e mais alguma porque, afinal, parecia mal não oferecer qualquer coisinha.

Mas que elas andassem assim, ainda compreendia. O que a irritava, era que a "obrigassem" também a sentir o mesmo.

Cruzes, credo, canhoto!

Ela queria era distância dessa maleita natalícia.

E foi, precisamente, para fugir dessa loucura temporária que Tita se refugiou, em plena véspera de Natal, na floresta. 

Ao passar por uma árvore, armada em Rainha Má da Branca de Neve, lembrou-se de lhe perguntar:

- Árvore minha, árvore minha, haverá alguém que goste menos do Natal do que eu?

Para sua surpresa, a árvore respondeu-lhe:

- Mas tu gostas do Natal!

- Ai isso é que não gosto! Alguma vez?

- Pois vou mostrar-te o contrário. Abraça-me.

- Eu? Abraçar uma árvore? Mas está tudo doido?! 

No entanto, lá fez o que a árvore lhe disse e, nesse instante, foi transportada para perto de uma cabana.

- Boa! O que faço agora?

Bateu à porta. Apareceu uma senhora idosa. Ao início, muito surpreendida com a visita mas, logo em seguida, animada.

- Ah, deve ser a menina que me vem ajudar com o jantar! Entre, entre.

E antes que Tita pudesse esclarecer o que quer que fosse, já estava a ser levada para a cozinha, e orientada para o que deveria fazer. Afinal, o tempo estava a passar e havia muita gente a contar com aquela refeição.

Não que fosse, propriamente, um menu diversificado ou abastado. Haveria uma sopa com muitos legumes e um pouco de carne, para aconchegar o estômago e aquecer o corpo gelado, acompanhada do pão caseiro que estava pronto a ir ao forno, e um bolo de frutas para sobremesa. 

- Se a senhora vive aqui sozinha, para quem é toda esta comida? 

- Ah menina... será para quem aparecer... 

- Mas está à espera de visitas?

- Nunca se sabe menina, nunca se sabe... 

E, dali a pouco, realmente, apareceu uma família que se tinha perdido na floresta. Um casal com dois filhos que, muito aborrecido, lamentava o incidente e o Natal estragado. Não por eles, claro, mas pelas crianças.

A senhora idosa virou-se para eles e garantiu que poderiam passar ali a noite, e que os miúdos se divertiriam, até porque havia um palhaço de serviço.

- Também está à espera de um palhaço?  - perguntou Tita.

- Já cá está! - respondeu a senhora idosa, apontando para Tita.

- Ah não, eu não...

Mas a senhora não a deixou terminar. Levou-a até ao sótão, pegou numas roupas que estavam guardadas na arca e entregou a Tita, para que se vestisse a preceito.

Enquanto isso, um forte nevão caiu e, não podendo voltar para casa, dois lenhadores acabaram por ficar ali na cabana também.

Ao pé da lareira, como não podia deixar de ser, os seus cães deitaram-se, a aproveitar o calor que dela emanava.

Tita não tinha muita habilidade com cães, mas ficou embevecida com aqueles dois meninos tão bem comportados, que só queriam mimos, e pareciam não a largar desde que a viram descer. 

À socapa, ainda lhes deu dois pedacinhos de carne, que eles agradeceram com uma dancinha à sua volta, e umas lambidelas. 

Tinha a senhora idosa acabado de chamar todos para a mesa, quando chegaram umas vizinhas desta, uma trazendo um licor, e a outra um pote de doce, que elas mesmas tinham feito, para oferecer à anfitriã que, agradecida, as convidou para a ceia.

E assim, por entre o aconchego, as conversas, a comida, e as palhaçadas de Tita, ajudada pelos seus escudeiros caninos, se passou a noite.

Muito diferente dos Natais que Tita costumava passar todos os anos. Até nem foi assim tão mau.

Esteve entretida. Sentiu-se útil. Ajudou a fazer alguém feliz.

Ali reinou a simplicidade. A humildade. A partilha. A entreajuda. A bondade. 

Pessoas estranhas, que o destino decidiu juntar naquela pequena cabana. Sabe-se lá porquê... Talvez para que olhassem de uma forma diferente para o Natal.

Tita fechou os olhos por um instante, absorvida por estes pensamentos, e pela gratidão que sentia, e lhe tinha sido retribuída.

Quando os abriu, estava de novo ao pé da misteriosa árvore que, sorrindo, lhe dizia:

- Então, ainda achas que não gostas do Natal?!

- Não é que não goste... É só que... Nunca tive um Natal como eu o imagino. É sempre a mesma coisa, e cada vez me desilude mais.

Ao que a árvore respondeu:

- Compreendo. Mas vou dar-te um conselho.

- Mais do que tradições ou perfeição, o Natal são as pessoas com quem estás!

- E é aquilo que tu quiseres fazer dele, e com ele!

 

Em resposta ao desafio da Isabel

Desilusão

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Todos dizem que a melhor forma de não nos desiludirmos, é não esperarmos muito das pessoas.

Não criar muitas expectativas.

Mas há momentos em que já não se trata disso.

Em que a desilusão já não resulta de qualquer expectativa que pudessemos ter, mas de surpresa, por nos estar a ser mostrado um lado que desconhecíamos. Que diz muito sobre a pessoa que o mostra. E que não gostamos.

 

Não tem de vir, necessariamente, de conflitos, de discussões, de palavras ditas no calor do momento, de atitudes parvas. Pode vir quando não estamos a contar.

Numa simples conversa. 

 

Mas, por vezes, causa mais dano.

Porque não se limita a ferir. Não cicatriza, e deixa marca.

Simplesmente, mata.

Uma parte daquilo que sentimos morre com essa desilusão.

E não volta a ressuscitar...

Os "rejeitados da vida"

Joven egoísta rechazado por la sociedad por su molesto comportamiento.  concepto de problema psicológico, comunicación con una persona abusiva  desagradable. ilustración de vector de color en estilo plano. | Vector  Premium

 

Alguns de nós, humanos, temos tendência para querer ajudar os "coitadinhos", os "rejeitados da vida".

Pessoas com problemas que achamos que podemos solucionar.

Com coisas mal resolvidas que, estupidamente, nos convencemos que conseguimos desemaranhar.

Com feridas que julgamos poder curar.

Com revoltas que julgamos conseguir apaziguar.

Com mágoas que acreditamos que, por magia, faremos desaparecer.

 

Aquelas pessoas que nos fazem crer que ninguém as entende.

Que ninguém gosta delas. 

Que são umas sofredoras.

Que toda a vida tiveram azar, e nada lhes corre bem.

 

Temos até, uma predisposição inata para nos conectarmos com elas.

Com tanta gente à nossa volta, parecem um íman que nos atrai.

E, do alto da nossa vaidade, bondade ou ingenuidade, sei lá, pensamos que podemos fazer a diferença.

Que somos aquela pessoa que vai melhorar as suas vidas. Que os fará mais felizes. Que, connosco, irão mudar.

 

Eu também sou (ou era) um pouco assim. 

Mas, à medida que os anos vão passando, cada vez tenho menos paciência. Cada vez mais me convenço que só nos estamos a enganar a nós próprios.

Há pessoas que, simplesmente, não querem ser ajudadas. Nunca vão mudar.

Cada um é como é.

Então, o que acontece é que, em vez de as trazermos para cima, são elas que nos puxam para baixo.

E, em vez de as "consertarmos", são elas que nos destroem.

Pois que se lixem todos.

 

Acreditamos tanto que podemos ajudar que não percebemos que não fazemos milagres.

É como procurar as ondas do mar numa piscina que nunca as terá.

Por mais que tentemos que aquelas águas se movam, ondulem, não fiquem estagnadas, nunca serão ondas naturais.

E, se não deixarmos de bater em pedra dura, arriscamos a, quando menos esperarmos, tornarmo-nos nós os coitadinhos.

 

Eu sei que nem toda a gente é assim e que, de facto, há pessoas que merecem uma oportunidade mas, a determinado momento, levam todas por tabela.

Porque percebemos que a verdadeira oportunidade, não são os outros que a têm que dar. Tem que vir da própria pessoa.

E, se ela não estiver disposta a isso, nada, nem ninguém, terá esse poder.