Guardamos tanta coisa só para nós - opiniões, sentimentos, ideias, estados de espírito, reflexões, que ficam arrumados numa gaveta fechada...
Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!
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Abri essas gavetas, e o resultado é este blog!
Estreou no dia 23, na Netflix, o filme "As Nadadoras", baseado na história real das irmãs sírias Sara e Yusra.
É um filme sobre refugiados, os perigos que correm para fugir da guerra, para lutar por uma vida melhor, e concretizar os seus sonhos.
Sobre o quão difícil, desesperante, frustrante e nem sempre bem sucedido é o trajecto desde a partida, até onde pretendem chegar.
Sobre a discriminação que sofrem, as burocracias que enfrentam, as burlas a que estão sujeitos, a ajuda humanitária que lhes é oferecida.
É um filme sobre família, sobre união, sobre compreensão, sobre querer o melhor para os seus, ainda que isso signifique a separação, e a distância.
É um filme sobre coragem, sobre sacrifício, sobre entreajuda, sobre objectivos, sobre o futuro.
Duas irmãs em busca de uma vida melhor, mas com destinos bem diferentes.
Yusra, sempre focada na natação, na participação nos Jogos Olímpicos. Já Sara, apesar de também ser nadadora, mais perdida nos seus objectivos, e sem saber bem o quye fazer, e que caminho seguir.
Na altura em que fugiram de Damasco, Yusra tinha 17 anos. Sara era mais velha.
Para trás ficou o pai, a mãe, e a irmã mais nova.
Apesar de não terem seguido à risca o plano inicial, elas conseguiram chegar à Alemanha.
Agora, Yusra tem 24 anos, e Sara, 27.
Depois de competir no Rio 2016,Yusra esteve entre os atletas que disputaram as medalhas nas Olimpíadas de Tóquio em 2020, e participou no Campeonato Mundial da FINA de 2022 em Budapeste.
Em 2017, ela foi nomeada a mais jovem Embaixadora da Boa Vontade do ACNUR – Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.
Yusra é, agora, cidadã alemã.
Sara regressou à Grécia para ajudar outros refugiados que chegavam ao país, mas foi presa em 2018, por lavagem de dinheiro, contrabando, tráfico humano e até espionagem, e passou três meses detida. Apesar de, entretanto, ter sido libertada sob fiança, Sara ainda corre o risco de ser condenada de 25 anos de prisão.
Infelizmente, é o preço a pagar por ajudar a salvar vidas.
Antes de mais, devo advertir que esta série talvez não seja aconselhável a pessoas que perderam familiares recentemente.
Mas, caso a comecem a ver, não se deixem (des)iludir pelo primeiros episódios. São enganadores.
Desde que a série estreou, que tudo o que tenho lido sobre a mesma vai num único sentido: excelente série, forte, dramática, é impossível alguém não se emocionar.
Pois eu, confesso, vi o primeiro episódio e... que grande seca!
Como é possível dizerem bem, quando isto é tão sem graça, tão banal, tão "mais do mesmo"?
Mas insistiam em dizer-me que valia a pena.
Lá continuei a ver. O segundo, ainda sem grande vontade. O terceiro, a melhorar. Daí para a frente, foi um atrás do outro.
E sim, vale bem a pena!
Para já, pela banda sonora, sobretudo as músicas italianas.
Depois, por tudo isto:
É uma lição de verdadeiro amor
O amor de Amy e Lino é posto à prova de todas as formas, mas nem por isso é abalado ou destruído.
Eles complementam-se. Tentam ser felizes, e fazer o outro feliz.
Tentam resolver os problemas. Conversam. Apoiam-se, em todos os momentos.
Afinal, amor é amizade, desgosto, apoio, família, felicidade, dor, beleza.
Há histórias de amor que são para sempre. E amores verdadeiros que vivem para além da vida.
É uma lição sobre a importância da família
Podemos não ter as mesmas ideias, as mesmas formas de viver, os mesmos objectivos.
Os nossos familiares podem não ser perfeitos, podem dar connosco em doidos, podem não nos compreender.
Podemos até nos desentender, dizer coisas que não devíamos, por vezes magoar.
Mas a verdadeira família, está lá quando é preciso.
Nos bons, e nos maus momentos.
E que não sejam preciso os maus momentos para voltar a unir familiares desavindos. Porque mais vale tarde que nunca, mas o tarde pode ser tarde demais.
É um alerta para a vida
Porque a vida pode ser curta. E nunca sabemos o que ela nos reserva.
Hoje estamos bem. Amanhã tudo pode mudar.
Nada é garantido.
É uma lição sobre nunca desistir dos sonhos
De que serve a vida sem sonhos?
De que serve viver pela metade?
Lino dizia muitas vezes a Amy: "Porque não? Como dizem os americanos, é tudo ou nada!"
E sim, é verdade que, mesmo que os cheguemos a concretizar, a vida pode vir, e destruí-los.
Mas não terá valido a pena tentar?
Aproveitar o que nos foi permitido experienciar?
É uma história sobre mudanças, aceitação, integração
Nem sempre é fácil mudar para um país diferente, onde somos apenas mais uma pessoa, um forasteiro.
Longe da família, longe dos amigos, longe daquilo que sempre nos fez feliz.
Nem sempre é fácil querer agradar, e ser rejeitado, ainda que não intencionalmente, e sentir que não sabemos o que estamos ali a fazer. Apenas, que não pertencemos ali. Que nos sentimos deslocados, perdidos.
Lino sentiu isso na pele.
Até as coisas mudarem, e ele estar totalmente integrado na nova vida.
É uma história sobre multiculturalismo
Amy, uma americana do Texas, a viver em Los Angeles, e Lino, um italiano de Castelleone (Sicília), a viver em Florença, e que se muda para Los Angeles, uma cidade que não tem centro, onde ninguém liga a futebol, onde não se come nada daquilo que ele está habituado.
Mas será que, apesar de mundos tão diferentes, e de famílias com tradições e culturas tão distintas, o principal não é universal?
É uma lição de coragem, resiliência, superação
Cancro: maldito cancro.
Esse bicho que continua a fazer estragos e a levar a melhor sobre aqueles que atinge.
Lino descobre que tem um cancro raro, e todo o seu mundo desaba.
Agora que tinha aberto o seu próprio restaurante, é obrigado a fechá-lo, para dar prioridade ao tratamento.
Agora que Amy tinha abdicado de um dos seus trabalhos, em prol daquele que, apesar de lhe pagar menos, a fazia mais feliz, tem que voltar a trabalhar duplamente.
Lino vence a primeira batalha.
Mas a guerra ainda estava no início.
Depois de um ensaio experimental que correu bem, e de se manter relativamente saudável durante 7 anos, eis que a vida lhe prega outra partida.
Só que, desta vez, é bem pior do que antes.
É uma história sobre os laços que unem a família
Como diz Amy, no fim, família são as pessoas que escolhemos amar, sejam elas de sangue, ou não.
Amy e Lino queriam ser pais. Mas a fertilização in vitro não fazia parte dos seus planos e, por isso, adoptaram uma menina - Idalia.
A maternidade/ paternidade não foi um desafio fácil para nenhum deles.
Por um lado, Amy começou por perder o crescimento da filha, por ter que trabalhar pelos dois. Por outro lado, Lino era um excelente pai, mas sentia falta de voltar a trabalhar.
Mas, no fundo, o que mais importava era a felicidade de Idalia.
Na verdade, o que mais importa é o bem dos filhos, sejam eles biológicos, adoptados ou emprestados.
É uma história sobre recomeços
Amy e Lino tiveram que partir do zero algumas vezes.
Conseguiram sempre dar a volta.
Será que conseguem vencer esta derradeira batalha?
Haverá ainda chance de Amy, Lino e Idalia terem um novo recomeço?
Ou esse será apenas para alguns deles?
A despedida
Como se despede, um pai, de uma filha?
Como se despede, uma filha, de um pai?
Como dizemos adeus à pessoa que amamos? Com quem planeámos toda uma vida? Com que ainda queríamos concretizar tantos sonhos?
Como nos despedimos, da melhor fase que estamos a viver, para o incerto? Para o abismo?
Como voltar a viver?
Onde encontrar forças para tal?
Escolhas
A vida de Amy e Lino foi recheada de escolhas.
Escolhas que trouxeram tristeza, escolhas que trouxeram felicidade.
Mas foram as suas escolhas.
E é assim que continuará a ser, até ao fim.
Porque a vida (e a morte) só a eles diz respeito.
Ver esta série fez-me, obviamente, recordar a morte da minha mãe, os problemas de saúde do meu pai, e o cancro de que me livrei a tempo e que, por pouco, podia ter feito estragos.
Fez-me pensar na minha filha, no quanto ainda quero estar presente na vida dela. No quanto ainda quero viver com ela.
E voltou a lembrar-me que as pessoas boas são sempre as primeiras a partir.
Embora, mais cedo ou mais tarde, todos sigamos o mesmo caminho.
Deixo aqui a música que mais me marcou no final da série:
Uma destas noites sonhei que estava a ouvir uma música.
Ou melhor, o refrão de uma música em que, para além da parte instrumental, só consegui perceber "palavras ao vento".
Não sei se existe, se ouvi em algum lado e ficou aqui gravado, ou se o meu cérebro inventou, mas decidi dar à parte musical do refrão, uma possível letra.
E, já que inventei o refrão, porque não tentar criar o resto?
Aqui fica:
"Dizes que ainda me amas
E que não me queres perder
Que as coisas ainda podem mudar
Que ainda temos muito para viver
A mim parecem desculpas
De quem quer esconder a verdade
Não quero um assumir de culpas
Queria apenas sinceridade
(refrão)
Isso são tudo palavras ao vento
Da boca p'ra fora e sem sentimento
Confesso que esperava muito mais de ti
Tudo o que dizes é só no momento
Podia acreditar em ti, mas lamento
Quero muito mais do que isso para mim
Percebi que não basta amar
Para fazer com que tudo dê certo
É como tentar encontrar
Um oásis no deserto
De nada adianta falar
Se as palavras não geram acção
Só servem para enganar
Não vêm do coração
(refrão)
Isso são tudo palavras ao vento
Da boca p'ra fora e sem sentimento
Confesso que esperava muito mais de ti
Tudo o que dizes é só no momento
Podia acreditar em ti, mas lamento
Quero muito mais do que isso para mim
E se os gestos contrariam as palavras
E se os anos passam, e tudo permanece igual
De que adianta querer fingir
Que o amor é imortal?
De que adiantam sucessivas conversas
Se voltamos sempre ao mesmo ponto
Palavras que não passam de promessas
Às quais já não quero dar um desconto
(refrão)
Isso são tudo palavras ao vento
Da boca p'ra fora e sem sentimento
Confesso que esperava muito mais de ti
Tudo o que dizes é só no momento
Podia acreditar em ti, mas lamento
Quero muito mais do que isso para mim
Mais vale assumir agora
Sem mágoa ou ressentimento
A verdade que em ti mora
Sem qualquer arrependimento
Só com honestidade
Podemos seguir em frente
E são essas as palavras
Que quero guardar na minha mente."
Agora, quem quiser que aproveite a letra, e componha a música!
Nicola tinha acabado de chegar ao seu local de trabalho provisório.
Ainda ficaria por ali uns dias, mas a sua vontade era ir embora o mais depressa possível. Por ela, naquele mesmo dia.
Tinha ficado tão perturbada com o encontro que tivera pelo caminho, que quase já nem conseguira descobrir o caminho para ali.
Se ela soubesse que tinha, na família, pessoas tão estranhas... Claro que, por dinheiro, as pessoas são capazes de tudo, até mesmo dentro da família. Mas isso era algo que ela estava habituada a ver nas notícias, não tão perto de si. Não a ponto de afectá-la pessoalmente.
A verdade é que, quando era mais nova, nunca tinha visto o tio, que andava sempre em parte incerta. Só algum tempo depois de ela ter saído daquela terra, é que este regressou às raízes. Por isso, nunca tinham estado juntos. Não se conheciam, de todo.
Mas, se Nicola soubesse, preferia não o ter conhecido.
Só aquele olhar, provocara-lhe um arrepio na espinha. Como se transmitisse más energias.
O olhar e, muito provavelmente, o facto de ele estar com uma arma na mão, em jeito de ameaça. Não a ela, propriamente. Mas em forma de recado, para o seu pai.
Nicola sabia que o tio tinha emprestado dinheiro ao seu pai, numa altura em que ele precisara. Mas o tio andava a fazer pressão, a exigir a devolução do dinheiro. Dinheiro que, tinha ficado acordado, o pai entregar no dia seguinte.
Assim, aquela interpelação não fazia qualquer sentido. Nicola estava ali de passagem. Não tinha nada a ver com os acordos entre irmãos. E, ainda que assim fosse, que necessidade havia de mostrar a arma, e fazer crer que a poderia utilizar, caso as coisas não corressem como ele queria?
Ia matá-la? Matar o seu pai? Seria o seu tio um bandido. Um homem sem escrúpulos?
Nicola limitou-se a informar que o pai tinha o dinheiro, e a perguntar se o acordo não era entregá-lo no dia seguinte, ao que o tio assentiu, frisando que era só para perceber se tudo estava encaminhado, deixando-a seguir caminho.
E ela assim o fez. Não ficaria ali para descobrir mais sobre ele. Já sabia que chegasse para não querer qualquer relação com o mesmo.
Conforme combinado, no dia seguinte tudo se resolveu.
Nicola estava a fotografar as últimas flores, no âmbito do seu trabalho, quando viu passar o tio, juntamente com dois outros irmãos, ao longe.
Mais uma vez, sentiu aquela sensação de mal estar. Mas, ao mesmo tempo, não conseguiu tirar os olhos dele e, nem sabe bem porquê, viu-se a desejar que o tio olhasse para ela, como se isso fosse importante, quando o que ela mais queria era sair dali para fora e passar despercebida àquela pessoa.
No entanto, a determinado momento, como se tivesse ouvido o "chamado" da sobrinha, o tio olhou para ela, e dizendo aos irmãos que ia só despedir-se de Nicola, aproximou-se.
A verdade é que, também ele, não tinha ficado indiferente a Nicola. Ela não era como o resto da família.
Ela tinha força, garra. Ela não tinha mostrado medo dele, nem mesmo quando o viu com a arma na mão. Ela não vacilou. Não fraquejou. Enfrentou-o.
Ela era, de certa forma, parecida com ele. Tencionava conhecê-la melhor, se tivesse oportunidade para isso. E, talvez, apagar aquela primeira impressão que lhe possa ter causado.
- Olá Nicola! Como é que estás?
- Bem. E o tio?
- Queria desculpar-me por ontem. Sei que posso ter parecido muito frio e insensível. Até mesmo um criminoso. Mas nunca vos faria mal. É só a minha maneira de ser, desconfiado, bruto. Estou a tentar aceitar e ser aceite por esta família, que há muitos anos não via, e a adaptarmo-nos mutuamente. Espero que também tu, com o tempo, nos possamos conhecer melhor e me possas vir a aceitar, da mesma forma que o teu pai.
Nicola ouviu todo aquele discurso sem reação.
Se, por um lado, lhe apetecia dizer que aquilo era só conversa da boca para fora, para ver se ela se deixava enganar e levar pelas mentiras e justificações esfarrapadas dele, porque nada justificava os seus actos, por outro, sentia um estranho magnetismo, impossível de explicar e bastante incómodo, que a impelia a deixá-lo falar, sem ripostar. A fingir que acreditava nas boas intenções do tio.
Por um lado, Nicola tinha vontade de mostrar que não era como o pai, e que ele, a ela, não enganava. Queria cortar ali mesmo o mal pela raiz, e qualquer hipótese de relação futura, deixando-lhe isso bem claro.
Por outro, sentia que, por alguma estranha razão, não queria declarar guerra aberta ao tio, preferindo deixá-lo falar, e ver no que aquilo daria.
Algo lhe parecia dizer que os seus caminhos ainda haveriam de se cruzar de novo.
E, assim, deixou-o ir, sem ter dito uma única palavra...
Na vossa opinião, o que poderá estar por detrás desse estranho magnetismo?
Haverá mesmo algum segredo ou ligação por desvendar sobre ambos?