"A Filha" é uma série da TVI, baseada na história verídica do caso Esmeralda.
Apesar de se distanciar, em alguns pontos, da realidade, a essência, e o verdadeiro cerne da questão, estão lá.
São apenas 6 episódios, e vale a pena ver!
A justiça nem sempre funciona. Nem sempre funciona bem. Nem sempre é justa. E nem sempre é aplicada a pensar naqueles que mais importam. Ninguém é dono da verdade mas certo é que uma má decisão pode ter consequências terríveis sobre quem mais deveria ser protegido.
Eu tenho uma opinião muito vincada em relação a este tema. Defendo a criança.
E é nela que qualquer pai ou mãe, ou avós, biológicos ou não, advogados e juízes deveriam pensar.
Sem imposições. Sem mudanças drásticas. Sem cortes radicais.
A própria criança deveria, quando possível, ser ouvida. Mostrar aquilo que quer.
Como referi, a série relata a história de uma forma um pouco diferente da verdadeira. E é com base, exclusivamente, neste enredo de "A Filha" que vou opinar. Sobre as sucessivas falhas que foram sendo cometidas, pelos vários envolvidos.
Porque, o que deveria ter acontecido, pelo bem da criança, era ela estar com a mãe biológica. Não podendo, e já que estava a ser criada por aquele casal (ainda que sem adopção oficial), era o melhor para a criança que assim continuasse. O pai, mostrando agora interesse em estar com a filha, não deveria ter entrado a "a matar", da mesma forma que o casal não deveria ter sido tão intransigente. Era perfeitamente possível fazerem todos parte da vida da criança, pensando sempre no melhor para ela, para a sua estabilidade emocional. E, uma dia mais tarde, talvez ela decidisse com quem queria ficar. Infelizmente, não foi isso que aconteceu.
O egoísmo substituiu o bom senso.
Paulo é um carpinteiro que namora com Susana, a qual tem um filho e, aparentemente, é uma relação estável que ele quer preservar.
No entanto, isso não o impediu de andar com Heloísa, uma cantora de bar que ele conheceu por lá, e com quem se envolveu por alguns dias, semanas, até ela começar a mostrar que queria uma relação mais séria, e ele a informar por mensagem que não a queria ver mais.
Até aí, tudo bem. Não fosse o facto de Heloísa ter engravidado de Paulo.
Paulo nunca quis saber, apesar de Heloísa lhe ter contado.
Para ele, ela era uma galdéria, que andava com vários, e qualquer um podia ser o pai. Para ele, ela estava a tentar prendê-lo, e ele não queria. Nem ela, nem o suposto filho.
Heloísa decidiu ter a criança, e teve que se desenrascar sozinha.
Paulo nunca, em momento algum, quis tirar a dúvida, fazendo um teste de ADN. Não quis conhecer a bebé. Desprezou-a. Nem sequer ajudou Heloísa na única coisa que ela lhe pediu - registar a bebé para poder colocá-la na creche, e poder trabalhar para sustentar-se a si e à filha.
Paulo continuou a sua vidinha, com a namorada e o enteado, como se nada tivesse acontecido.
Esta foi a primeira falha de Paulo.
Enquanto isso, Heloísa viu-se sem nada. Sem nem mesmo ter como alimentar a bebé.
Clandestina em Portugal, sem documentos, sem trabalho, sem ninguém que a ajudasse, sem ter como cuidar da filha, Heloísa fez aquilo que nunca pensou: entregar a sua bebé a um casal que queria muito ter filhos, sem sucesso, para que eles criassem a sua filha.
E, aqui, pergunto-me: não tendo aquelas pessoas, ou quaisquer outras, qualquer obrigação de ajudar Heloísa, seria esta a única ajuda que lhe conseguiam dar?
Por muita vontade que quisessem, de ser pais, alguma vez pensaram se seria justo tirar uma criança da mãe? Não terá havido aproveitamento do desespero de Heloísa para fins, de certa forma, egoístas?
Porque ali ninguém fez o que fez para ajudar Heloísa. Fizeram-no, por interesse próprio.
Esta foi a primeira falha destes pais adotivos.
Heloísa não suportou a dor, e acabou por morrer.
Ainda assim, não faltou amor a Renata, entretanto Maria Júlia, e ela cresceu rodeada de uma verdadeira família. A única que ela conheceu.
Independentemente dos motivos, Cristina e Zé foram os pais de Maria Júlia.
Até que Paulo (e aí não percebi bem como ou porquê), foi intimado pelo MP, a fazer um teste de ADN para confirmar a paternidade de Maria Júlia.
Após o resultado positivo, Paulo decide, então, quer quer a sua filha. Aquela de quem, até ali, nunca quis saber. Nem se estava viva, ou morta. Ou se precisava de alguma coisa. De ajuda. De si, o pai.
Erros todos podemos cometer, e estamos sempre (ou quase sempre) a tempo de os corrigir.
Aceito que Paulo tenha, agora, uma outra noção das coisas. Que se tenha arrependido. Que queira recuperar o tempo perdido. E achi justo que ele possa fazer parte da vida da criança.
Mas tirar uma criança dos únicos pais que ele teve, não é a solução.
E esta foi a segunda falha de Paulo.
Por outro lado, os pais adoptivos, Cristina e Zé, a partir do momento em que souberam da existência deste pai, e do processo para ficar com a guarda de Maria Júlia, esconderam-se. Nunca permitiram qualquer contacto do pai com ela. Com receio de a perder, acabaram a mudar-se de uma casa para outra, como dois foragidos, sem nunca comparecer em tribunal, nem aceitar qualquer notificação.
A advogada de Paulo decide então pedir que ambos sejam considerados arguidos por crime de sequestro e subtracção de menor.
E Zé acaba mesmo por ser preso, e passar vários meses na prisão, sem nunca dizer onde está Maria Júlia.
A minha dúvida aqui prende-se com questões legais: porque é que só Zé foi preso? Porque é que Cristina continuou em liberdade? Como é que uma criança, da qual toda a gente já sabe do caso, estuda numa escola sem que haja qualquer denúncia às entidades competentes? E as autoridades, não deveriam andar à procura de Cristina? Porque, apesar dos cuidados, ela não anda propriamente fugida. Chega até a viver em casa dos pais.
Mas, adiante.
Zé é libertado, após uma certa campanha a seu favor, com influência da primeira dama, e de muitas outras pessoas, até figuras públicas, após uma primeira opinião pública que defendia o pai biológico, e condenava os adoptivos.
Mais confiantes e, ao mesmo tempo, cansados e percebendo que há que resolver a situação, para o bem ou para o mal, Zé e Cristina comparecem finalmente na audiência, para ficar a saber que a menina vai mesmo ser-lhes retirada, e entregue ao pai.
O que para mim não faz sentido nenhum.
E o pior não tarda em acontecer.
Maria Júlia, que agora voltou a ser Renata, não está bem.
Ela tem saudades da sua família. Dos seus pais. Da sua rotina.
Ela não se identifica com esta nova família. Com esta nova vida.
Por muito desejada que seja, ela está triste.
E acaba mesmo por fugir de casa, de madrugada, colocando-se em risco.
Paulo não consegue perceber que, por mais que seja o pai biológico, os laços e sentimentos não se podem forçar. E que é preferível ela estar bem, longe, do que perto, mal.
Na vida real, Esmeralda, voltou a viver com os pais adoptivos, de quem tinha sido retirada aos 8 anos, aos 17 anos.
Será preciso, na série, esperar tanto tempo?
Ou será que Renata vai conseguir, com o tempo, habituar-se ao pai biológico, e esquecer os pais adoptivos e a sua anterior vida?
Com actuações de Dalila Carmo, Diogo Infante, Luciana Balby, José Condessa, Rita Lello, Sara Barradas, Inês Castel-Branco, Cucha Carvalheiro e São José Lapa, entre outros, quem não acompanhou pode ver a série aqui
Imagem: tvi.iol.pt